Tramita na Secretaria de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável de Minas Gerais (Semad), um pedido de licença protocolado pela empresa Fênix Mineração para extrair ouro em Mariana (MG). Para desenvolver a atividade, seria necessário desviar o curso do Rio Gualaxo do Norte, um afluente do Rio Doce.
O local almejado para a exploração fica a 8 quilômetros do distrito de Bento Rodrigues e foi devastado na maior tragédia ambiental do país, quando ocorreu o rompimento de uma barragem da mineradora Samarco, liberando aproximadamente 60 milhões de metros cúbicos de rejeito. O episódio, que provocou 19 mortes, destruição de comunidades, devastação de vegetação e poluição da bacia do Rio Doce, completou dois anos no último domingo (5).
Segundo a engenheira Maria Conceição Bittencourt, que presta consultoria para a Fênix Mineração, os possíveis impactos estão detalhados no pedido da mineradora. “O órgão ambiental ainda vai analisar e fazer vistoria no local e, se aprovar, deve impor condicionantes e medidas mitigadoras. Isso é sempre feito”.
O pedido para o empreendimento foi apresentado à Semad em março deste ano, ao qual foi anexado o relatório técnico e o Estudo de Impacto Ambiental (EIA). Nos documentos, a empresa sustenta que o desvio do Rio Gualaxo do Norte em uma extensão de aproximadamente 1,5 quilômetro é necessário para as atividades que serão desenvolvidas.
“Tem como objetivo preservar a sua qualidade e a reconformação da calha, que atualmente se encontra bastante assoreado e com boa parte do seu leito original já deslocado em virtude do rompimento da barragem de rejeito da Samarco”, acrescenta o documento.
De acordo com a Semad, o pedido de licença prévia e de licença de instalação ainda não teve sua análise iniciada. “Conforme formulário de caracterização do empreendimento, preenchido pelo empreendedor, o requerimento é de 50 mil toneladas por ano de produção bruta”, informou o órgão. Possíveis prejuízos para o processo de recuperação ambiental da área serão avaliados ao longo da análise.
O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), estima que ainda restam aproximadamente 6,1 milhões de metros cúbicos de rejeito armazenado desde a junção do Rio Gualaxo do Norte com o Córrego Santarém, em Mariana, até a Usina de Candonga, em Santa Cruz do Escalvado (MG). Em nota, órgão informa que, considerando a magnitude da tragédia, o Rio Gualaxo do Norte vem apresentando sinais de recuperação e melhoria em sua qualidade ambiental. “Alguns indicadores disso são o retorno de colonização pela biodiversidade aquática e as melhorias nos níveis de turbidez em vários trechos”, registra o texto.
O Ibama é um dos órgãos públicos que integra o Comitê Interfederativo, criado para fiscalizar as ações de recuperação ambiental da tragédia. Estas ações são desenvolvidas pela Fundação Renova, instituição criada conforme acordo assinado entre a Samarco, suas acionistas Vale e BHP Billiton, os governos de Minas Gerais e do Espírito Santo e o governo federal.
Ainda de acordo com o Ibama, a melhoria das condições do Rio Gualaxo do Norte “depende da continuidade dos compromissos assumidos pela Fundação Renova, além do monitoramento ambiental para acompanhamento da evolução de cada ponto”. Por sua vez, a Fundação Renova foi indagada pela Agência Brasil sobre o pedido da Fênix Mineração, mas não quis se manifestar. Informou apenas que “não tem ligação com o processo de licenciamento referido”.
Aval da prefeitura
A mineradora já obteve a carta de conformidade da prefeitura de Mariana. O documento, que deve atestar se a proposta do empreendimento está de acordo com as leis municipais de uso e ocupação do solo, é um pré-requisito para solicitar a licença junto à Semad.
“Não cabe ao Codema autorizar ou não a extração de qualquer tipo de mineral. O que ele faz é analisar o EIA [Estudo de Impacto Ambiental] e verificar se o que a empresa apresentou segue as normativas existentes para que a atividade seja viabilizada. É apenas uma autorização para que o processo continue, mas não há nenhuma garantia de que o empreendimento será colocado em prática. Dar essa garantia é atribuição do governo do estado”, diz o prefeito.
Duarte Júnior ressalta ainda que está em curso um grande programa, realizado juntamente com outros municípios, voltado para a recuperação do Rio Gualaxo do Norte, do Rio do Carmo e do Rio Doce. “É um investimento de quase R$ 500 milhões. E é óbvio que estaremos atentos se houver qualquer risco de dado. Em Mariana, nós também estamos com o nosso código ambiental para ser aprovado. E nós queremos ter a prerrogativa de que, mesmo com a autorização do estado, o município possa suspender um empreendimento caso seja detectado qualquer tipo de risco”.
Impacto econômico
Os impactos da crise econômica que atinge todo o país foi agravado em Mariana com a paralisação das atividades da Samarco, que ainda não tem previsão para retomar as operações. De acordo com a prefeitura, cerca de 25% da população ativa está desempregada. A arrecadação com a Compensação Financeira pela Exploração dos Recursos Minerais (Cfem), conhecido como o royalty do minério, foi de R$145 mil em março deste ano. Neste mesmo mês, foi arrecadado R$577 mil em 2013, R$563 mil em 2014 e R$892 mil em 2015.
O quadro ainda tende a se agravar, pois o município recebe com uma retroatividade de dois anos a sua parcela do imposto sobre circulação de mercadorias e prestação de serviços (ICMS). O tributo é pago pelas empresas que realizam operações de venda, transferência e transporte de mercadorias ou serviços de transporte e comunicação. Muitas dessas empresas em Mariana mantinham contrato com a Samarco e reduziram ou encerraram suas atividades. Com os dois anos da tragédia, a prefeitura prevê uma queda de R$4 milhões ao ano na arrecadação do ICMS.
De acordo com o prefeito Duarte Júnior, as atividades da Fênix Mineração não causariam impacto significativo na economia do município. “Seria bem gradativo. Eles pretendem começar com algo pequeno. Não dá pra dizer que seria uma solução de renda ou de geração de novos postos de trabalho no município. Não consigo te afirmar com exatidão, mas imagino que seja algo que criaria inicialmente cerca de 20 empregos”, diz.
Por Léo Rodrigues, da Agência Brasil, in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 13/11/2017
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