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quarta-feira, 15 de novembro de 2017

Magistrados gaúchos aprovam tese em Congresso: é preciso reforçar o papel do juiz na proteção do Meio Ambiente


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Patrícia Laydner (fonte)
A Juíza de Direito Patrícia Antunes Laydner propôs e seus colegas aprovaram por unanimidade a tese de que “É preciso reforçar o papel do juiz na proteção do Meio Ambiente”. A tese foi uma das sete aprovadas no final do XII Congresso Estadual de Magistrados, do Rio Grande do Sul, realizado em Bento Gonçalves, em 29 de setembro de 2017.
A magistrada afirmou que “Em um contexto de governança ambiental, o Poder Judiciário deve exercer um papel relevante para a proteção do meio ambiente, preparando-se para enfrentar os problemas ligados à complexidade da matéria e às especificidades que marcam os litígios ambientais. Se a especialização de jurisdições representa um movimento importante neste sentido, também é necessário incrementar a formação ambiental dos juízes e rever certas exigências de produtividade (metas), incompatíveis por vezes com a efetividade buscada em ações desta natureza.”  
No texto da justificativa, que segue adiante, a Dra. Patrícia observa que a fixação de meta exigente em relação a números de processos julgados, como ponto de medição da produtividade do magistrado,  fixada pelo Conselho Nacional de Justiça, não leva em conta a complexidade dos processos na área ambiental.  Ela pergunta: Ainda, como conciliar as exigências probatórias do processo ambiental com a celeridade exigida institucionalmente e que se traduz, dentre outros, pelas metas impostas pelo CNJ?
Abaixo o texto integral da Justificativa como proposta a aprovada por unanimidade pela assembleia de Juízes:
JUSTIFICATIVA
Ramo autônomo do direito, que protege bens de interesse coletivo e essenciais ao equilíbrio planetário, o direito ambiental é marcado por uma visão de futuro que visa a preservação de um patrimônio esgotável, o que explica sua evolução jurídica crescente. Esta evolução, que se traduz pelo reconhecimento de um direito fundamental ao meio ambiente equilibrado e se materializa pela sua integração na ordem constitucional, aponta para a necessidade de maior eficácia na instrumentalização de sua proteção jurídica.



Contudo, na medida em que o direito ambiental avança, ele tende a se tornar cada vez mais complexo. Marcado pela influência da ciência e pela multiplicação de fontes, sua complexidade também decorre de características próprias aos bens ambientais. Transversalidade, preocupação com as gerações futuras, risco de irreversibilidade, predominância do interesse coletivo, são fatores que justificam a existência de normas abundantes, voltadas à proteção do patrimônio ambiental, que não seguem necessariamente os standards do direito tradicional e que, a seu turno, são confrontadas a fatos também marcados pela complexidade.
É neste contexto que o juiz contemporâneo, intérprete supremo das normas, passa a assumir um papel de garantidor de direitos sociais e coletivos, missão que ultrapassa a “simples” solução de conflitos individuais para incluir a administração de complexas situações controversas. Seguindo a noção de governança ambiental, a Justiça também exerce um papel importante de guardiã do direito ambiental e sua atuação deve sempre levar em conta o dever de proteção imposto pela Constituição.

Ora, no momento em que a Justiça brasileira enfrenta uma carga de trabalho excessiva – cuja solução passa inclusive pela adoção de novas formas de gestão inspiradas da administração privada, nem sempre adaptáveis à realidade jurídica e, principalmente, à realidade dos feitos ambientais – a gestão dos processos ambientais, marcados pela importância e complexidade que lhes é própria, representa um verdadeiro desafio.
Com efeito, partindo-se de uma visão instrumentalista do processo, o sucesso de uma ação ambiental não está particularmente atrelado à velocidade de julgamento, mas principalmente à capacidade do judiciário em responder aos anseios da sociedade. Em tratando-se de meio ambiente, esta resposta não é simples, pois envolve gestão de riscos e da urgência, conciliação de interesses por vezes antagônicos (ambiental, econômico e social), extrema atenção na condução das provas e, em alguns casos, um certo desapego à celeridade em prol da busca de uma proteção efetiva.
Ora, como exigir tal postura do magistrado quando, ao lado de complexas e extenuantes demandas ambientais, ele deve enfrentar processos de toda natureza, como ações envolvendo saúde, infância ou matéria de família, cuja urgência é premente? Ainda, como conciliar as exigências probatórias do processo ambiental com a celeridade exigida institucionalmente e que se traduz, dentre outros, pelas metas impostas pelo CNJ?
Esta questão, por si só espinhosa, deve ainda levar em conta a existência de lacunas importantes na formação ambiental dos magistrados. Com efeito, a grande maioria dos juízes atualmente em exercício não teve contato com a disciplina durante os estudos universitários e a oferta de formação oficial nesta área, embora existente, ainda é escassa e atrai poucos interessados.
Um caminho possível na busca da efetividade da jurisdição ambiental seria o incremento da especialização de varas ambientais. Muitas são as vozes que defendem a necessidade de especializar a jurisdição nesta área, tendência aliás observada mundialmente, sendo que o modelo de especialização adotado no Estado do Rio Grande do Sul, restrito ao primeiro grau de jurisdição e exclusivamente à comarca de Porto Alegre é ainda muito incipiente, principalmente em comparação a iniciativas de sucesso adotadas por outros tribunais.
Mas somente a especialização não nos parece suficiente. Principalmente em razão do caráter multidisciplinar e transversal que marca o direito ambiental, é possível pensar em uma tendência de integração, que se manifesta em diferentes escalas, de acordo com maior ou menor importância que possa ter a questão ambiental em conflitos de outra natureza e que implica, de toda forma, em um dever de atenção às variantes ambientais pelo julgador, ainda quando estas se constituam em aspectos acessórios do litígio.
Urge, portanto, a despeito de qualquer iniciativa de especialização, sensibilizar e preparar os magistrados para o enfrentamento das questões ambientais, o que passa pelo incremento da formação nesta área.

Por fim, há de ser repensada a questão dos parâmetros de produtividade impostos aos juízes no que diz respeito aos litígios ambientais complexos. De um modo geral, ações civis públicas e ações coletivas voltadas à proteção do meio ambiente não deveriam ser submetidas a metas genéricas, que não levam em consideração as dificuldades específicas e o resultado que se busca nesta espécie de demanda.
REFERÊNCIAS
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  • R. THOMÈ, Manual de direito ambiental, Salvador, Podium, 6a ed., A. VAN LANG, Droit de l’environnement, Paris, PUF, 3a ed., 2011.


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