Como parte da campanha de Milão para promover uma política alimentar urbana que seja sustentável, os estudantes são exortados a levarem para suas casas as sobras dos alimentos não perecíveis em um saquinho onde se lê “Eu não desperdiço”. Foto: Municipalidade de Milão
Como parte da campanha de Milão para promover uma política alimentar urbana que seja sustentável, os estudantes são exortados a levarem para suas casas as sobras dos alimentos não perecíveis em um saquinho onde se lê “Eu não desperdiço”. Foto: Municipalidade de Milão

Milão, Itália, 30/4/2015 – Como podemos dar alimentos saudáveis a todos sem colocar em perigo a sobrevivência de nosso planeta? Esse é o assunto primordial da Exposição Internacional de 2015 (Expo 2015), cujo tema central,Alimentar o planeta, energia para a vida, é um enorme desafio para as cidades. Cerca de 50% da população mundial vive atualmente em zonas urbanas e se prevê que essa proporção aumentará para 66% até 2050. Garantir o direito à alimentação de todos os cidadãos e cidadãs, especialmente da população pobre urbana, é chave para promover o desenvolvimento sustentável e equitativo.
Como cidade anfitriã da Expo 2015, que começará amanhã, 1º de maio, Milão tem uma grande visibilidade e uma oportunidade política extraordinária para trabalhar pela construção de sistemas alimentares urbanos mais residentes. Esta é uma visão que a prefeitura decidiu realizar mediante a formulação de sua própria política alimentar e a adesão de tantas cidades quantas forem possível ao Pacto sobre Políticas Alimentares Urbanas, um compromisso mundial para “alimentar as cidades” de uma maneira mais justa e sustentável. A política alimentar que será implementada pelo governo de Milão nos próximos cinco anos é elaborada mediante um amplo processo participativo, a partir da avaliação das fortalezas e fraquezas do sistema atual da cidade.
Este é um panorama complexo, com algumas luzes e sombras que destacam várias áreas temáticas que a política alimentar deve considerar, como o acesso aos alimentos, o impacto socioambiental de sua produção e distribuição, os resíduos alimentares e a educação.
Milão tem mais de 1,3 milhão de habitantes, mas quase dois milhões de pessoas vão todos os dias à essa cidade italiana para trabalhar, estudar, se divertir ou receber cuidados médicos.
Com sua empresa pública de alimentação, Milano Ristorazione, a cidade prepara e distribui mais de 80 mil refeições diárias para escolas, asilos de idosos e centros de alojamento. Portanto, há muito que a cidade pode fazer para melhorar e difundir as boas práticas, por exemplo, ao abordar o problema dos resíduos e melhorar a sustentabilidade da cadeia alimentar.
Muitos projetos já estão em andamento. Mais de um terço das frutas e verduras servidas por Milano Ristorazione é orgânico, 57% têm sua origem em lugares próximos, e aos estudantes se pede que levem para suas casas as sobras dos alimentos não perecíveis.
A cada ano as famílias de Milão desperdiçam alimentos equivalentes a um mês de consumo, mas várias organizações sem fins lucrativos guardam os excedentes dos supermercados e cafeterias e os distribuem a mais de uma centena de organizações beneficentes na cidade.
Mas, como a pobreza aumenta em consequência da prolongada crise econômica, a sociedade civil e as instituições públicas trabalham ativamente para ajudar os necessitados. Os restaurantes populares oferecem cerca de dois milhões de refeições por ano e o próprio município de Milão entrega outras quase 250 mil às pessoas idosas e deficientes.
Atualmente a prefeitura consulta os cidadão, organizações da sociedade civil, acadêmicos, empresários e cozinheiros inovadores, entre outros, para saber sua opinião sobre os temas que deveriam ser abordados pela política alimentar da cidade. O objetivo é elaborar um documento estratégico a ser discutido no conselho municipal em maio, quando começarão a trabalhar as várias mesas de planejamento, cuja tarefa será converter essas diretrizes em projetos-piloto.
O processo culminará na adoção da política alimentar pela municipalidade de Milão e o lançamento de uma série de projetos-piloto que abordarão alguns dos temas expostos nessa política nos próximos anos.
Enquanto isso, o Pacto de Política Alimentar Urbana avança em bom ritmo. A ideia de um protocolo internacional sobre as políticas alimentares locais foi proposta em fevereiro de 2014 pelo prefeito da cidade, Giuliano Pisapia, na cúpula do Grupo de Liderança Climática, conhecido com C40, em Johannesburgo, na África do Sul.Alguns meses mais tarde, Milão e mais de 30 cidades de todo o mundo começaram a analisar o Pacto, mediante a troca de dados, metas e melhores práticas através de seminários pela Internet realizados no contexto do projeto Cidades com Inteligência Alimentar pelo Desenvolvimento, financiado pelo programa Desenvolvimento, Educação e Sensibilização (DEAR), da União Europeia.
É emocionante ver como áreas urbanas muito diferentes, como Nova Iorque, São Paulo, Gante, Daegu, Abidjã e Melbourne compartilham projetos, ideias, problemas e soluções com um objetivo comum, a construção de uma rede de cidades decididas a trabalharem juntas para transformar seu futuro, com o tema da comida como uma prioridade da agenda política.
Um grupo de especialistas internacionais trabalha em um projeto de protocolo do Pacto que será submetido a um conselho assessor e às cidades. A tarefa do conselho, integrado por organizações internacionais como Organização para a Alimentação e a Agricultura, Organização Mundial da Saúde, Programa Mundial de Alimentos e Comissão Europeia, é revisar o pacto e garantir que seja compatível com outras iniciativas internacionais sobre temas semelhantes.
Muitas cidades demonstraram interesse em aderir ao Pacto de Política Alimentar Urbana, que será assinado em outubro por ocasião do Dia Mundial da Alimentação, e seus defensores esperam que seja um dos legados mais importantes da Expo 2015. No futuro próximo, o Pacto também estará presente na Conferência sobre Mudança Climática da Organização das Nações Unidas (ONU) que acontecerá em Paris no próximo mês de dezembro.
A agricultura e a produção de alimentos são os principais contribuintes para as emissões de gases-estufa, e a mudança climática afetará enormemente nossa capacidade produtiva. A construção de um mundo mais resistente, onde se garanta o direito de todos à alimentação, é um processo que precisa começar a partir das cidades e de sua capacidade para desenvolver políticas sustentáveis. Envolverde/IPS
*Maurizio Baruffi é chefe de pessoal da prefeitura de Milão, a cidade anfitriã da Exposição Internacional de 2015.
(IPS)