Reportagem de André Antunes – EPSJV/Fiocruz
Divulgar experiências exitosas de produção agroecológica e de organização comunitária foi um dos objetivos da Caravana Agroecológica do Semiárido Baiano, que percorreu localidades ao longo do São Francisco, no norte da Bahia, entre os dias 26 e 30 de junho.
Com esse objetivo, a caravana, que reuniu cerca de 70 pessoas de diversas organizações, entre elas a Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz), visitou, no dia 29 de junho, a comunidade de Coxo de Dentro, localizada na cidade de Jacobina, para conhecer o trabalho desenvolvido pela Associação Comercial dos Moradores e Agricultores de Coxo de Dentro. Com 112 membros, a associação, criada em 2000, vem trabalhando na organização do trabalho de extração do babaçu feita pelos moradores da comunidade e também na indução da transição agroecológica na produção da agricultura familiar local.
A comunidade fica em uma região de transição da caatinga para a mata atlântica, uma área com elevados índices pluviométricos e rica em nascentes, que abastecem alguns dos rios mais importantes do norte da Bahia, como o Itapicuru. “A gente tenta mostrar para a comunidade que é melhor para o meio ambiente e para a saúde produzir de maneira sustentável, sem utilizar nenhum tipo de agrotóxico nem fertilizantes químicos”, diz Robério Santos de Jesus, presidente da associação, que explica que as lavouras utilizam um biofertilizante natural produzido ali mesmo. “A variedade da produção também combate os insetos. Ao invés de plantar uma coisa só, você vai diversificando a produção, para que o inseto ataque uma planta e já não ataque outra”, explica Robério, que ressalta ainda a importância da rotatividade de culturas para a preservação dos solos, que reduz a necessidade de utilização de fertilizantes.
A extração do babaçu, que complementa a renda gerada pela comunidade através da comercialização da produção em feiras orgânicas da região, também é feita de acordo com os princípios da agroecologia: as palmeiras ocorrem naturalmente na região, e somente os frutos que caem no chão são recolhidos. Na associação local é feito o beneficiamento. “É um produto que se aproveita tudo. Aqui a gente faz carvão, faz o óleo do babaçu, faz sabonete, hidratante e também faz bijuterias, artesanato”, lista Robério.
Ieda Amaral, moradora da comunidade que trabalha na extração do babaçu, conta que anteriormente era comum a retirada dos cachos do alto das palmeiras. “Eu mesma cortei muito cacho de babaçu para vender na feira. A gente não tinha uma sobrevivência boa. Não era certo, mas eu era obrigada”, lembra Ieda, que completa: “Depois que a gente foi trabalhando, vendendo as coisas da roça, foi que a gente foi aprendendo a trabalhar na roça e deixar mais o coco sossegado. Quando a gente cortava não tinha quase coco no mato. Hoje tem muito”, ressalta. Ieda conta ainda que a transição para a agroecologia em seu roçado significou mais diversidade para sua produção e alimentação. “Hoje só compro no mercado o que não produzo aqui: arroz, feijão e carne. O resto eu planto: cenoura, beterraba, agrião, alho-poró, cebolinha, abóbora…” enumera. Antes, continua, ela plantava apenas banana e mandioca, e usava venenos pra combater pragas na lavoura. “Depois que eu aprendi a trabalhar assim me sinto outra pessoa, mais esperta na vida”, comemora.
Ieda Amaral, moradora da comunidade que trabalha na extração do babaçu, conta que anteriormente era comum a retirada dos cachos do alto das palmeiras. “Eu mesma cortei muito cacho de babaçu para vender na feira. A gente não tinha uma sobrevivência boa. Não era certo, mas eu era obrigada”, lembra Ieda, que completa: “Depois que a gente foi trabalhando, vendendo as coisas da roça, foi que a gente foi aprendendo a trabalhar na roça e deixar mais o coco sossegado. Quando a gente cortava não tinha quase coco no mato. Hoje tem muito”, ressalta. Ieda conta ainda que a transição para a agroecologia em seu roçado significou mais diversidade para sua produção e alimentação. “Hoje só compro no mercado o que não produzo aqui: arroz, feijão e carne. O resto eu planto: cenoura, beterraba, agrião, alho-poró, cebolinha, abóbora…” enumera. Antes, continua, ela plantava apenas banana e mandioca, e usava venenos pra combater pragas na lavoura. “Depois que eu aprendi a trabalhar assim me sinto outra pessoa, mais esperta na vida”, comemora.
Comunidade quilombola gera renda a partir da organização comunitária
“Somos quilombolas, temos muito a oferecer para o Brasil. Mas precisamos resgatar nossa história e nossa cultura”. A frase é de Valdecy dos Santos, moradora da comunidade de Monteiro, povoado do município de Caém reconhecida como remanescente de quilombo pela Fundação Palmares em 2011. Presidente da Associação Quilombola dos Produtores de Mandioca de Bom Jardim e Monteiro (Aquibom), Valdecy recebeu a caravana para falar sobre a organização da comunidade em torno de uma unidade de produção de beiju, feito a partir da mandioca. Fundada há 10 anos e com cerca de 40 membros, a associação produz e comercializa seus produtos através de feiras orgânicas e da venda para comerciantes locais, como supermercados e padarias. O beiju produzido pela associação também compõe o cardápio da merenda dos estudantes das redes municipal e estadual de ensino, por meio do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), que destina alimentos produzidos pela agricultura familiar para as escolas públicas. “Tudo que conseguimos para a nossa comunidade foi através do trabalho da associação: poste de iluminação, posto de saúde, creche”, afirma Valdecy, que diz sentir falta de apoio do governo na comunidade, que ainda luta pela regularização de suas terras. “Aqui na associação só quem tem documento de terra é meu pai, se precisar só ele que tem. É uma dificuldade grande que a gente tem aqui. E a gente sabe que a gente tem direito, somos quilombolas. Mas muitas vezes sentimos falta de apoio, ficamos sem ter a quem recorrer”, diz Valdecy.
Cooperativa traz ganhos para catadores de material reciclável
Na cidade de Jacobina, a caravana parou para conhecer o trabalho desenvolvido por uma cooperativa de catadores de material reciclável, a Recicla Jacobina. Criada há quatro anos, a cooperativa reúne 34 trabalhadores, que recolhem e vendem para reciclagem materiais como vidro, plástico e papelão. São três caminhões e quatro carrinhos motorizados para fazer a coleta. “A Cooperativa é muito importante aqui em Jacobina, porque antes disso era lixo na rua, na beira do asfalto. Quando o calor é demais ele pegava fogo, isso aqui era um caos”, lembra Elizabeth Santana, presidente da Recicla Jacobina. “Hoje a gente pega, imprensa e vende para fazer outro produto. É muito melhor do que você deixar enterrado e contaminar o subsolo e o ambiente onde a gente vive”, completa. Segundo Elizabeth, o trabalho dos catadores tem ajudado a evitar que os resíduos sólidos vão parar no rio que corta a cidade. “Agora, a coisa importante que o governo tinha que fazer era esgoto, porque não tem. Em Jacobina você passa em cada rua que o fedor cobre, e é um perigo, tanto pra gente quanto para a população”, pontua.
Segundo Elizabeth, o grosso do material ainda é recolhido do aterro controlado da cidade, que fica ao lado do galpão da cooperativa. A coleta seletiva, que os catadores ajudaram a implementar na cidade, ainda é muito incipiente, de acordo com Elizabeth. Segundo ela, a organização dos trabalhadores na cooperativa contribuiu para melhorar as condições de trabalho dos catadores, que ganham hoje entre R$ 1,2 mil e R$ 1,5 mil por mês. “Antes, quando a gente era autônomo, vendia material abaixo do preço, sempre enriquecendo o atravessador. Depois da cooperativa, a gente conseguiu um preço melhor”, revela a presidente da Recicla Jacobina. Apesar disso, ela afirma que a principal dificuldade da cooperativa é organizar os catadores e ampliar o número de cooperados. “O maior sonho da gente é crescer mais a Cooperativa, contratar mais cooperados e dar emprego a pessoas que não têm. Mas aqui tem regra, e tem muito catador que não se adapta. É uma dificuldade unir os catadores”, aponta.
Caminho a seguir
Para o professor-pesquisador da EPSJV André Búrigo, visibilizar as experiências positivas das comunidades visitadas durante a caravana contribui para evidenciar que há alternativas aos projetos de desenvolvimento hegemônicos. “É possível produzir e se organizar pra um outro tipo de sociedade que tenha menos impacto ambiental, que busque uma forma de uma relação positiva com a natureza. As comunidades tradicionais, as comunidades quilombolas que a gente visualizou também mostram que onde você tem comunidade organizada, onde você tem assistência técnica adequada chegado, você consegue produzir resultados positivos”, assinala. Luciana Khoury, promotora de Justiça e coordenadora do Núcleo da Bacia do Rio São Francisco acredita que o conhecimento das práticas sustentáveis compartilhadas pelos comunidades durante as caravanas servirão de subsídio para o trabalho do Ministério Pùblico. “A gente entende que isso nos fortalece até mesmo do ponto de vista do conhecimento das possibilidades para intervenção”, avalia Luciana, que integra também o Fórum Baiano de Combate ao Impacto dos Agrotóxicos. “O Fórum tem uma análise muito definida de que não existe uso seguro de agrotóxico. O caminho que a gente aponta no Fórum é o não uso mesmo, e por isso essa Caravana é tão importante, pra poder mostrar os anúncios das experiências agroecológicas, que seria realmente a forma de se viver com qualidade, não só pra quem produz, mas também para o consumidor e para os ecossistemas”, diz ela.
in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 18/07/2017
Nenhum comentário:
Postar um comentário