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sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

Belo Monte a partir da voz dos de baixo, artigo de Gisele Nogami

O Comitê Metropolitano “Xingu Vivo Para Sempre” implementa uma série de ações de agitação contra a construção da hidrelétrica de Belo Monte, projetada para ser construída no sudoeste do Pará, no rio Xingu. Uma das ações é a realização de palestras em escolas e universidades em Belém. Em novembro a economista e mestre em Planejamento do Desenvolvimento pela Universidade Federal do Pará (UFPA), Elen Pessôa esclareceu os discentes do oitavo período de Jornalismo da Universidade da Amazônia (Unama). A militante faz parte do quadro do movimento.
A economista informou que o Comitê Metropolitano “Xingu Vivo Para Sempre” é um coletivo de organizações, movimentos sociais e ambientalistas, da região de Altamira e das áreas de influência da hidrelétrica de Belo Monte, que se opuseram à instalação do projeto no rio Xingu. O “Xingu Vivo para Sempre” conta com o apoio de mais de 250 organizações locais, estaduais, nacionais e internacionais.
Elen fez um breve retorno na história, para destacar que o modelo de desenvolvimento implementado na região amazônica sempre foi pautado nos grandes projetos de exploração, seja dos recursos vegetais, minerais ou hídricos. O boom na exploração da região aconteceu durante o período do Governo Militar (1964-1985), quando ocorreu a ocupação da Amazônia de forma sistemática. Nesta época, os militares justificavam a ocupação e o desmatamento desordenado, através do discurso de que os grandes projetos trariam para a região o “desenvolvimento e a modernização”. As usinas hidrelétricas, como a de Tucuruí, podem ser consideradas um dos grandes exemplos de projetos de exploração da Amazônia. De acordo com os dados do movimento, são previstos para a região mais de 60 projetos de hidrelétricas.
A representante do “Xingu Vivo para Sempre” defende a não implantação dos projetos, já que segundo ela, estes alteram o espaço físico da região, do ambiente, das relações sociais e familiares e restringem os territórios. Elen citou um possível exemplo de como pode ocorrer esta modificação nas relações da população que vive na área de influência de um local onde será implantada uma hidrelétrica: acontece a mudança dos agricultores para a cidade, o que provoca o inchaço destes municípios. Sem conseguir formas de sustentar a família, já que foi “expulso” de sua terra e, sem estar inserido em nenhum projeto de reordenamento, o agricultor vive em meio a circunstâncias que aumentam o nível de violência (contra crianças, mulheres, e de forma geral) e geram outras situações, como a prostituição.
Elen criticou o papel imprensa, pois segundo ela, os veículos de comunicação não denunciam os “bastidores do desenvolvimento” e, ao contrário, retratam a implantação destes projetos, somente de forma positiva, com números que mostram a geração de novos empregos e renda da população, a partir da instalação destes projetos.
A representante do movimento disse também, que a maneira como tem sido conduzida a construção da Usina de Belo Monte, não é diferente da Usina de Tucuruí. “Paga-se muito pouco pelas propriedades e, não se oferece locais para se realocar estas pessoas”. Ela citou outro exemplo, desta vez, de uma senhora que precisou se deslocar de sua propriedade, com a construção da hidrelétrica de Tucuruí e, que também será afetada, com a implantação de Belo Monte. “A senhora precisou sair de Tucuruí para Marabá, com a construção da hidrelétrica, utilizando as verbas de indenização. Depois, aconteceu no lugar onde ela vivia, uma praga de pulgas e, ela precisou se mudar novamente. Como não havia mais recursos da indenização, ela precisou dispor de capital próprio para mudar-se para Altamira. E agora, ela está desesperada, pois a construção de Belo Monte deixará sua propriedade alagada”. O reassentamento das populações locais é um dos graves passivos dos grandes projetos.
Elen Pessôa esclareceu sobre o conceito de deslocamento compulsório – que é uma situação ou mecanismo no qual diversas pessoas são obrigadas a deixar seu território de maneira forçada e tentar se estabelecer em outro lugar, sendo a constituição dos grandes projetos um fator importante na consumação deste mecanismo – e as etapas em que elas se desenvolvem: 1 – as populações tradicionais são obrigadas a deixarem seus territórios; 2 – acontece o rompimento de relações sociais simbólicas; 3 – ocorre o rompimento de relações sociais simbólicas; 4 – as populações são privadas pelo Estado, de se tornarem visíveis; 5 – os atores sociais são tratados e considerados entraves do desenvolvimento; 6 – a intervenção no território os expõe a uma nova realidade, tornando-os vulneráveis às imposições que lhe são colocadas; 7 – o deslocamento induz a população afetada a um processo de exclusão física, econômica e social.
A representante do Xingu Vivo destacou que o movimento é contra a construção da Usina de Belo Monte, e justificou tal opinião, ressaltando outras formas possíveis de geração de energia elétrica, como a eólica e a solar. “No entanto, como é o mercado que rege o setor, ou seja, a necessidade de se fornecer energia elétrica para grandes indústrias, não há o interesse de se investir nessas outras fontes de energia”.
O documentário “Xingu, a luta dos povos pelo rio” foi apresentado para os alunos durante a palestra. O filme ilumina a trajetória de luta dos índios do Rio Xingu, contra a construção da Usina de Belo Monte. O registro reuniu cenas históricas deste processo, iniciado em Altamira, em 1989, e resgata os principais lances, até os dias de hoje, de uma batalha que se arrasta há mais de 30 anos. A voz dos de baixo é a ênfase do filme.
Por fim, a representante do movimento mostrou algumas estatísticas e mapas que demonstraram as áreas que deverão ser inundadas com as águas provenientes da barragem, caso o projeto avance. Dentre os dados apresentados, podem-se destacar os seguintes: – o projeto da usina de Belo Monte existe há mais de 30 anos. Antes previa-se a inundação de 18 mil quilômetros, hoje, a área foi reduzida para menos de mil quilômetros; – alguns estudos tratam da inviabilidade do projeto, já que a usina sozinha não se sustentaria. Ao invés dos 11 mil mega watts produzidos, na realidade, seriam apenas quatro mil mega watts; – o objetivo da construção da usina seria o de atender com energia barata, as empresas do Centro-Sul do país.
Deste total, 80% seriam para as empresas deste eixo, e os outros 20% para atender as empresas eletro-intensivas do Pará, como a Vale, Alcoa e Petrobras; – 80% dos recursos destinados a construção da usina são oriundos de recursos públicos, vindos do BNDES, a juros de 4% ao ano. Quem cobre as perdas do banco com o financiamento a baixo juro, é o contribuinte, através da dedução do imposto de renda; – Belo Monte vai custar R$ 30 bilhões aos cofres do Governo.
No entanto, muito antes da conclusão da obra, os investimentos já chegam a R$ 28 bilhões; – a usina vai secar um trecho de 100 quilômetros da volta grande do Xingu; – 20 mil pessoas serão remanejadas compulsoriamente, de acordo com o governo. Mas, estudos independentes apontam 40 mil pessoas retiradas de suas terras e, sem terem para onde serem remanejadas; por fim, 11 municípios da região serão afetados, entre eles: Altamira, Vitória do Xingu, Senador José Porfírio e Anapu.

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1FONTE : Gisele Nogami,  Jornalista recém-formada pela Universidade da Amazônia (Unama), Belém, Pará. O trabalho foi produzido para a disciplina Jornalismo Científico e Ambiental, ministrada pelo docente Rogério Almeida.
EcoDebate, 16/12/2011

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