Tenho conversado com amigos sobre o nosso novo momento. Conversado é modo de dizer, porque deste jeito virtual a conversa fica bastante diferente. Não tem olho no olho, não tem apartes, a gente não vê se a outra pessoa concorda ou não, a gente não sente a emoção da outra. Esquisito.
Mas, sigamos… Meu ponto de partida para reflexões tem sido, como não podia deixar de ser, sobre o que virá. Uma nova sociedade, mais justa, equilibrada, solidária, conectada com ambiente que nos cerca, com respeito aos bichos, plantas, mares, rios e terra?
Infelizmente, não creio.
Estamos sofrendo um duro golpe, que os cientistas afirmam que aqui no Brasil ainda nem chegou totalmente. Mas, daí a mudar comportamento de forma tão profunda… a conferir.
Desde o início do século mergulho meus pensamentos, leio, me atualizo, entrevisto pessoas, com foco neste devir, nesta necessidade de mudanças de paradigma para conseguir um jeito mais justo e inclusivo de viver neste mundo. Chamou-se de ecodesenvolvimento num determinado momento, quando houve a Rio-92, depois mudou-se para desenvolvimento sustentável, exigência dos Estados Unidos, nação mais rica, que não queria ver em primeiro plano a palavra ECO.
Que seja. O que importa é quem nos acompanha E se quem nos acompanha tem bala na agulha para propor mudanças. É disso que se trata. Num texto recente, o filósofo Bruno Latour lembra muito bem que…
“A todos os argumentos apresentados pelos ecologistas sobre a necessidade de alteração do nosso modo de vida, sempre se opunha o argumento da força irreversível do “trem do progresso”, que nada era capaz de tirar dos trilhos, “em virtude”, dizia-se, “da globalização”. Ora, é justamente seu caráter globalizado que torna tão frágil o famoso desenvolvimento, o qual, ao contrário, pode sim ser desacelerado e finalmente parado”.
“A todos os argumentos apresentados pelos ecologistas sobre a necessidade de alteração do nosso modo de vida, sempre se opunha o argumento da força irreversível do “trem do progresso”, que nada era capaz de tirar dos trilhos, “em virtude”, dizia-se, “da globalização”. Ora, é justamente seu caráter globalizado que torna tão frágil o famoso desenvolvimento, o qual, ao contrário, pode sim ser desacelerado e finalmente parado”.
Latour segue, conclamando nosso dever de cidadãos conscientes no sentido de dizer um sonoro “NÃO” a todos que querem, neste momento, dizer que “precisamos retomar o desenvolvimento”. Não precisamos retomar nada, meus caros. Precisamos sim, temos urgência, em refletir formas de mudar as coisas. Do jeito que estão, tem dado errado, e muito errado.
Quando eu editava o caderno Razão Social, que durante nove anos fez parte do jornal O Globo, uma das coisas que nos incomodavam, a mim, à Martha Neiva Moreira, à Camila Nobrega, à Cristiane Soares, ao Carlos Ivan, nosso time, era que nunca conseguimos dar uma manchete ao corpo do jornal. Hoje pela manhã, em conversa com Martha, elucidamos: não conseguíamos dar manchete porque não tínhamos pessoas no poder que pensassem claramente, com bons objetivos, nesta mudança necessária.
Ontem postei aqui a iniciativa da economista Kate Raworth, chamada modelo Donut de desenvolvimento, que já começou a ser testada na Holanda.
Nos Estados Unidos outra mulher, a parlamentar Alexandria Osasco-Cortez, propõe um novo New Deal (conjunto de programas econômicos aplicados por Roosevelt para combater a Grande Depressão), ao qual chama de Green New Deal.
Na Índia, a filósofa e ativista Vandana Shiva tem feito uma revolução com seu banco de sementes e propõe uma economia que promova mais respeito à biodiversidade. Segundo ela, é desse jeito, focando na nossa diversidade de alimentos, que se pode combater a fome global.
Por puro acaso dei exemplos de três mulheres. Ou será que não será puro acaso?
Fato é que toda mudança necessária, para ganhar manchete, precisa vir do poder público. Precisa que seja encampada por parlamentares que não tenham foco apenas em se perpetuar no poder ou em fazer falcatruas para ganhar dinheiro. É deles que necessitamos para pôr holofotes em nossas chamadas.
Nosso momento político tem propiciado um desmantelamento deste serviço do público. Que precisamos rever também este modelo de poder “representativo” entre aspas, não se tem dúvidas. O que não pode é desinstituir tudo, precarizar, envolver todos os políticos na mesma capa de “corruptos e ladrões e mal intencionados” sem ficar alertas com o buraco que vamos deixar vazios. São outros riscos, que não podem ser negados. Nem negligenciados.
Vamos ficar atentos. Muito atentos. O momento pede isto.
A jornalista Amelia Gonzalez criou e editou o caderno Razão Social, sobre sustentabilidade, no jornal O Globo e nos últimos sete anos foi colunista do site G1, sempre com foco neste tema
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