O que o gabinete escolhido por Michel Temer nos diz sobre meio ambiente e mudanças climáticas.
Por Redação do OC –
É nítido que o ministério Temer foi definido na barganha entre os partidos que apoiaram o processo de impeachment de Dilma Rousseff, sem levar em conta conhecimentos técnicos ou discussões programáticas. Até aí, sem novidades: estamos no “Brasil as usual”.
Quem espera ver Temer avançar agendas estratégicas que travaram no governo Dilma, como a de clima, porém, pode se frustrar. Além de ter ignorado a questão olimpicamente em seu discurso de posse (no qual confundiu “desenvolvimento sustentável” com “crescimento sustentado”), Temer dá sinais dúbios sobre a pauta ambiental e climática com a nomeação de seu gabinete.
Conheça abaixo os homens (não é figura de linguagem) do presidente e saiba que apito eles tocam sobre clima, energia e florestas.
Michel Temer
Em 2009, então presidente da Câmara, Temer contribuiu com a aprovação da lei de mudanças climáticas e com as metas que foram levadas a Copenhague. Por outro lado, numa traição a Dilma em 2011, negociou com a bancada ruralista, de quem é próximo, a Emenda 164, que desfigurava o Código Florestal. Seu governo dá mais poder aos ruralistas, o que tende a criar dificuldade para qualquer discussão sobre desmatamento, áreas protegidas e terras indígenas. Temer foi o homem do governo Dilma que negociou com os chineses desde agronegócio até ferrovias, mas deve ter consciência que a China embarcou na questão climática porque acompanha de perto os movimentos daquele país.
Eliseu Padilha (PMDB-RS), Casa Civil
Investigado pela Lava Jato, foi ministro dos Transportes de FHC e ministro da Aviação Civil de Dilma. Uma busca com nome de Padilha não retorna menções às mudanças climáticas, mas como ministro dos Transportes se mostrou muito próximo das empresas automotivas.
Moreira Franco (PMDB-RJ), assessor especial
Já foi prefeito de Niterói, governador do Rio de Janeiro, deputado federal, ministro de Dilma nas secretarias de Assuntos Estratégicos (SAE) e de Aviação Civil. É tido como o braço direito de Temer e tocará, no Palácio do Planalto, a agenda de retomada do crescimento. Foi o responsável pelo rascunho de plano de governo de Temer, a “Ponte para o Futuro”. Não tem a menor aproximação com a área ambiental, mas tampouco tem aversão especial a ela. Ignora-a olimpicamente. Defende privatizações e flexibilização do licenciamento.
Henrique Meirelles (PSD-GO), Fazenda
Já foi presidente internacional do Banco de Boston e presidente do Banco Central no governo Lula. Economista liberal da velha escola, não tem conhecimento nem curiosidade sobre o tema das mudanças climáticas. Uma busca com nome de Meirelles não retorna sequer uma menção ao tema.
Romero Jucá (PMDB-RR), Planejamento, Orçamento e Gestão
O senador investigado pela Lava Jato foi governador nomeado do Território de Roraima, vice-líder de FHC e ministro da Previdência Social de março e julho de 2005, quando foi afastado por conduta suspeita de corrupção e empréstimos bancários irregulares. Jucá é autor do PLS 654/15, que estabelece que o licenciamento ambiental “a jato” para grandes obras que sejam consideradas de “interesse público”: determina prazo máximo de nove meses para concessão da licença; elimina as três etapas do processo hoje vigentes; e retira dos órgãos ambientais a competência para paralisar empreendimento em caso de descumprimento de condicionantes. É contra a demarcação de terras indígenas e a favor da mineração nesses territórios. Sua família tem uma empresa com vários pedidos de lavra de ouro em terras indígenas de Roraima.
Geddel Vieira Lima (PMDB-BA)
Político, pecuarista e cacauicultor investigado pela Lava Jato, foi ministro da integração nacional de Lula e um dos articuladores do controverso projeto de transposição de águas do rio São Francisco. Na única vez que se manifestou publicamente sobre mudanças climáticas, na abertura da 1ª Conferência Nacional de Defesa Civil e Assistência Humanitária, em 2010, disse que a Conferência acontecia “num momento importante, onde mudanças climáticas, frutos do aquecimento global, infelicitaram boa parte do nosso país”.
Blairo Maggi (PP-MT), Agricultura
O senador, um dos maiores produtores de soja do mundo, foi relator da PEC 65/2012, que derruba licenciamento ambiental para obras. Desde que recebeu em 2005 o primeiro Prêmio Motosserra de Ouro do Greenpeace e foi apelidado pela imprensa internacional de “estuprador da floresta”, o Maggi sofreu questionamentos por parte de bancos internacionais e modulou seu discurso sobre florestas. Chegou a ensaiar antagonizar com Kátia Abreu, que sempre defendeu mais abertamente o desmatamento. Sua demão de verde, porém, não resistiu ao Código Florestal, onde votou pela flexibilização, e aos interesses de sua empresa, a Maggi Energia, em uma série de hidrelétricas na bacia do rio Juruena, na Amazônia.
Maurício Quintella (PR-AL), Transportes, Portos e Aviação Civil
O deputado também é investigado pela Lava Jato e já foi condenado em 2014 em esquema que desviou dinheiro da educação em Alagoas quando era Secretário de Educação do Estado. Quintella fez alguns apartes em discussões sobre mudanças climáticas na Câmara, sempre parabenizando colegas por discutirem o tema, mas nunca colocando observações sobre o mérito dos debates.
José Serra (PSDB-SP), Relações Exteriores
O senador foi governador de São Paulo, ministro do Planejamento e da Saúde de FHC e prefeito por um ano da capital paulista. Promulgou a lei que estabelece a Política Estadual de Mudanças Climáticas do de São Paulo em 2009, tentando cavar espaço político na véspera da Conferência de Copenhague em disputa com Lula/Dilma e Marina Silva. Como ministro da Saúde, foi pivô na posição Brasileira sobre os genéricos e soube negociar dentro da OMC, mostrando que sabe jogar o jogo diplomático. Poderia fazer o mesmo o clima, se quiser ou for convencido de que quer.
Bruno Araújo (PSDB-PE), Cidades
Celebridade instantânea por ter dado o 342º voto pelo impeachment e investigado pela Lava Jato, o deputado foi líder da oposição ao governo Dilma na Câmara e presidente da Comissão de Ciência e Tecnologia desta em 2011. Está na lista da Odebrecht e já foi acusado em 2014, pela revista Isto é, de ser lobista da indústria farmacêutica quando esta defendia a liberação de inibidores de apetite proibidos (sibutramina, anfepramona, femproporex e mazindol). A associação da indústria farmacêutica doou para sua campanha na época R$ 50 mil e mais cinco laboratórios (Aché, Biolab Sanus, Eurofarma, Libbs e Infan) doaram um total de R$ 405 mil, em três parcelas idênticas de R$ 27 mil cada um. Foi autor do PLC 77, que estabeleceu o Marco Legal da Ciência Tecnologia & Inovação elogiado pela presidência da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC).
Gilberto Kassab (PSD-SP), Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações
Talvez por influência de Eduardo Jorge (PV), seu secretário de Meio Ambiente na prefeitura de São Paulo, o deputado tem atuação na área de mudanças climáticas: promulgou a lei de clima da cidade de São Paulo, participou de cúpulas do grupo de prefeitos C40, promoveu no Ministério das Cidades o seminário internacional Desafios e Oportunidades para a Adaptação às Mudanças Climáticas da Mobilidade Urbana.
Marcos Pereira (PRB-ES), Desenvolvimento, Indústria e Comércio
Advogado, bispo licenciado da Igreja Universal do Reino de Deus, ex-vice-presidente da Rede Record de Televisão, presidente nacional do PRB. Não tem nenhum histórico no assunto (nem em clima, nem em desenvolvimento, indústria e comércio). Para viabilizar sua participação no ministério, e os votos do PRB no Congresso, Temer prometeu ao empresariado compor o segundo escalão da pasta com indicações técnicas do setor produtivo. Mas poderia ser pior: Temer cogitou entregar ao bispo, que é criacionista, a pasta da Ciência e Tecnologia.
Fernando Bezerra Coelho Filho (PSB-PE), Minas e Energia
Em seu terceiro mandato de deputado federal, o líder do PSB na Câmara, de 32 anos, é filho do Senador Fernando Bezerra, ex-ministro da Integração Nacional do governo do Lula. Será o mais novo ministro de Temer e o mais novo ministro de Minas e Energia da história. Suas páginas oficiais destacam um PL que dá incentivo fiscal à produção e comercialização de automóveis movidos a eletricidade ou híbridos e outro que dá isenção de IPI para veículos, máquinas e equipamentos de fabricação nacional adquiridos por órgãos da administração municipal.
José Sarney Filho (PV-MA), Meio Ambiente
O deputado foi ministro do meio ambiente de FHC e hoje é líder do Partido Verde, além de coordenador da Frente Parlamentar Ambientalista e integrante da Comissão Mista Permanente sobre Mudanças Climáticas do Congresso, que foi criada em 2008 por sua iniciativa. Dedicado ao tema, é próximo da sociedade civil.
Raul Jungmann (PPS-PE), Defesa
O deputado já foi diretor do Ibama, Ministro Extraordinário de Política Fundiária e Ministro do Desenvolvimento Agrário. Tem se manifestado recorrentemente em relação às mudanças climáticas e participou da COP16, em Cancún, em 2010. (Observatório do Clima/ #Envolverde)
* Publicado originalmente no site Observatório do Clima.
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