Bangladesh constrói muros de contenção costeira para proteger sua população e suas terras, diante da lamentável perspectiva de que nos próximos anos milhões de pessoas serão deslocadas pela intensificação das tempestades e elevação do nível do mar, situação agravada pela mudança climática.
Por Rafiqul Islam*
Daca, Bangladesh, 16/5/2016 – Em novembro, a Junta de Desenvolvimento da Água de Bangladesh (BWDB) assinou um acordo com a empresa chinesa First Engineering Bureau of Henan Water Conservancy para iniciar as obras do Projeto de Melhoria do Muro Costeiro.
Segundo funcionários da BWDB, a Junta já iniciou o trabalho de redesenhar o muro. Segundo o acordo, a empresa chinesa ajuda a reconstruir quatro pôlderes – áreas ganhas do mar e fechadas por diques – em dois distritos costeiros, Khulna e Bagerhat. Bangladesh fica em um delta baixo o que converte este país em um dos mais vulneráveis à mudança climática.
A região costeira, vizinha à baía de Bengala, se caracteriza por uma vasta rede de rios com maré e morfologicamente ativos. A planície do delta e a força da maré fazem com que,nos estuários do sul,esta incida nos processos dos rios águas acima, e a mudança climática intensificou essas marés nos últimos anos.
“Vamos reparar 139 pôlderes, considerando as mudanças derivadas do clima, que se presume ocorrerão até 2050, para proteger as populações costeiras de recorrentes desastres climáticos, como ciclones e tempestades”, explicou à IPS o ministro de Recursos Hídricos, Anisul Islam Mahmud. A BWDB trabalha atualmente para reconstruir 17 terraplenagens costeiras em sua primeira etapa, e os demais pôlderes serão reparados gradualmente, acrescentou.
Em janeiro, a Junta começou a fase 1 do Projeto de Melhoria o Muro Costeiro, ao custo de US$ 400 milhões e em cujo contexto serão reparados 17 pôlderes em seis distritos costeiros, Khulna, Satkhira, Begerhat, Pirojpur, Barguna e Patuakhali.A altura das terraplenagens de 200 quilômetros de comprimento será elevada de um a dois metros e serão instalados 58 reguladores na primeira etapa.
Desde a década de 1960, Bangladesh construiu 139 pôlderes para proteger cerca de 1,2 milhão de hectares de terra dos efeitos prejudiciais do mar e dedicá-los à agricultura de forma permanente, dentro das terraplenagens costeiras.Os pôlderes costeiros foram originalmente projetados para proteção das terras cultiváveis das marés altas e da intrusão salina. Mas os construídos há 60 anos correm risco pelo aumento das tempestades e dos ciclones, consequência do aquecimento global.
Dois grandes ciclones, Sidr, em 2007, e Aila, em 2009, causaram danos consideráveis às terraplenagens costeiras e colocaram em risco a vida das pessoas e de suas propriedades costeiras. Lipi Akhter, da zona de Shyamnagar Upazila, em Satkhira, sofreu o impacto do segundo ciclone, que deixou cerca de 200 mortos em Bangladesh.
O ciclone “Aila destruiu a maioria das fontes de água doce e das terras cultiváveis de Shyamnagar Upazila, complicando nossa já difícil situação”, contou o ministro. “Se outro fenômeno como esse voltar a atingir a costa, sem dúvida os velhos muros não aguentarão e as terras costeiras ficarão sob água salgada”, acrescentou.
O professor especialista em questões hídricas, Ainun Nishat, da Universidade Brac, disse à IPS que a intensidade dos eventos climáticos extremos é muito maior do que antes, o que eleva a vulnerabilidade dos pôlderes costeiros, somado ao aumento do nível do mar derivado do derretimento das geleiras.Os muros costeiros construídos na década de 1960 já perderam sua capacidade de resistir ao aumento dos ciclones e das marés de maior intensidade, acrescentou.
Segundo o professor, não há possibilidade de reconstruí-los para salvar a região costeira de Bangladesh.As atuais terraplenagens costeiras desempenham um papel vital na proteção da região dos eventos climáticos extremos, da produção agrícola e da vida da população, bem como enfrentando as consequências negativas da mudança climática. Mas as terras cultiváveis que ficam dentro dos pôlderes estão pouco acima do nível do mar.
Sem as terraplenagens, as comunidades costeiras ficarão sujeitas às flutuações das marés. Mas é preciso uma grande quantidade de dinheiro para redesenhar e reparar os pôlderes costeiros. Segundo a BWDB, são necessários US$ 2 bilhões para fortificar os muros costeiros para que suportem os desastres naturais agravados pela mudança climática.
O diretor executivo do Centro de Estudos Avançados de Bangladesh (BCAS) Atiq Rahman, destacou que a reconstrução dos pôlderes costeiros e sua manutenção serão o grande desafio deste país na hora de enfrentar os crescentes obstáculos climáticos para proteger as populações costeiras.
Segundo um estudo do Centro de Serviços Ambientais, Geográficos e de Informação (Cegis), com sede em Daca, cerca de um bilhão de toneladas de sedimento fluem pelos canais dos rios do país todos os anos, em direção à baía de Bengala. A sedimentação dos rios periféricos que rodeiam as terraplenagens causa alagamento, o que prejudica os pôlderes. A falta de manutenção também contribui para o congestionamento da drenagem interna e com a forte sedimentação externa.
Rahman destacou que deve ser aproveitado o projeto adequado das terraplenagens e as experiências das comunidades locais para a reconstrução dos pôlderes costeiros, a fim de que estas se tornem resilientes ao clima e mantenham os rios sem sedimentação.O nível do mar poderá subir de 26 a 98 centímetros em Bangladesh até 2100, segundo o volume de emissões contaminantes que forem liberadas na atmosfera.
Assim, este país perderá uma vasta extensão de terras cultiváveis, segundo a quinta avaliação do Grupo Intergovernamental de Especialistas sobre Mudança Climática (IPCC).Um estudo da organização não governamental local Unnyan Onneshan, realizado em 2012, o nível do mar aumentará um metro na região costeira de Bangladesh até 2100, o que afetará aproximadamente 25 mil quilômetros quadrados de terras, 17,5% do total, e deixará 31,5 milhões de pessoas deslocadas. Envolverde/IPS
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