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segunda-feira, 11 de abril de 2022
Como as pessoas são expostas à água contaminada com antibióticos sem saber
As pessoas ao redor do mundo estão, sem conhecimento, sendo expostas à água contaminada com antibióticos, o que pode dar início ao surgimento de patógenos resistentes a medicamentos e potencialmente alavancar outra pandemia global, segundo um relatório do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA).
UNEP
O estudo, realizado no mês passado, próximo ao Dia Mundial da Saúde em 7 de abril, revelou que, globalmente, não é dada a devida atenção à ameaça que a resistência antimicrobiana representa, com a maioria dos antibióticos sendo lançada no meio ambiente por meio de banheiros ou por defecação a céu aberto. Em 2015, 34,8 bilhões de doses de antibiótico foram consumidos diariamente e cerca de 90% deles foram lançados no meio ambiente ainda como substâncias ativas.
Embora 80% das águas residuais no mundo não sejam tradadas, até nos países desenvolvidos as estações de tratamento frequentemente não conseguem filtrar microrganismos perigosos. Isso pode gerar a reprodução de super microrganismos que podem contornar a medicina moderna e desencadear uma pandemia, alertam os autores do relatório.
Os antibióticos e outros medicamentos salvam vidas, mas precisam ser utilizados com cautela para que não haja uma resistência antimicrobiana, que apresenta riscos sociais, ambientais e financeiros para as empresas e para a sociedade em geral.Leticia Carvalho, diretora da Unidade Marinha e de Água Doce do PNUMA
Em 2019, as infecções que apresentaram resistência a antibióticos foram associadas à morte de quase 5 milhões de pessoas. Sem uma ação imediata, essas infecções poderão causar até 10 milhões de mortes por ano até 2050, revela o relatório: “Outra pandemia se esconde à vista de todas as pessoas. As consequências do contínuo desenvolvimento e disseminação da resistência antimicrobiana podem ser catastróficas”.
Os antimicrobianos são agentes cujo objetivo é matar os patógenos ou inibir o crescimento dos mesmos. A categoria inclui antibióticos, fungicidas, agentes antivirais, parasiticidas, assim como alguns desinfetantes, antissépticos e produtos naturais.
A resistência antimicrobiana ocorre quando microrganismos como bactérias, vírus, parasitas e fungos evoluem e se tornam imunes às drogas às quais eram vulneráveis anteriormente. Quanto mais os microrganismos são expostos aos produtos farmacêuticos, maior é a probabilidade de adaptação a estes.
“Os antibióticos e outros medicamentos salvam vidas, mas seu destino ambiental no curso de nossas águas tem importância. Eles precisam ser utilizados com cautela para que não haja uma resistência antimicrobiana, que apresenta riscos sociais, ambientais e financeiros para as empresas e para a sociedade em geral”, alerta Leticia Carvalho, diretora da Unidade Marinha e de Água Doce do PNUMA.
O que pode ser feito?
Segundo o relatório, essa ameaça global pode ser enfrentada por meio do controle da liberação da poluição por antibióticos, incluindo por meio da melhora no tratamento de esgoto e do uso mais seleto de antibióticos — frequentemente estes medicamentos são utilizados sem necessidade. O relatório recomenda a melhoria dos dados e do monitoramento de antimicrobianos e como estes são descartados. Também exige uma governança ambiental aprimorada e planos de ação nacionais para limitar a liberação de antimicrobianos.
O relatório pede aos países que adotem a abordagem One Health (“Uma Saúde”, na tradução literal), que está centrada na ideia de que a saúde humana e animal são interdependentes e ligadas à dos ecossistemas em que coexistem. A estratégia, por exemplo, exige que os países limitem o desmatamento, que frequentemente aproxima as pessoas de animais selvagens transmissores de vírus, permitindo que os patógenos saltem de uma espécie para outra.
“A pandemia de COVID-19 ensinou lições, uma delas é a necessidade de prevenir e enfrentar várias ameaças à saúde ao mesmo tempo, especialmente suas dimensões ambientais”, segundo o relatório.
Cinco fontes principais
Um estudo recente sobre a poluição farmacêutica dos rios do mundo concluiu que níveis mais altos de patógenos resistentes a antibióticos foram encontrados em países de baixa a média renda e foram associados a áreas com pouca infraestrutura de gestão de águas residuais e de resíduos, além das áreas onde há a fabricação de produtos farmacêuticos.
De acordo com um relatório do PNUMA, Há cinco fontes principais de poluentes que contribuem para o desenvolvimento e propagação da resistência antimicrobiana. Estes são:
saneamento, tratamento de esgoto e efluentes precários, agravados, por exemplo, pela defecação a céu aberto e o uso excessivo de antibióticos para tratar a diarreia;
efluentes da fabricação farmacêutica;
resíduos de centros de saúde;
uso de antimicrobianos e esterco na produção agrícola; e
liberações da produção animal.
Dimensões da mudança climática
Temperaturas mais elevadas também estão associadas ao aumento de infecções resistentes a antimicrobianos, conclui o relatório. Muitas doenças são sensíveis ao clima, e mudanças nas condições ambientais e de temperatura podem levar a um aumento na propagação de doenças bacterianas, virais, parasitárias, fúngicas e transmitidas por vetores.
Eventos climáticos extremos e a elevação dos lençóis freáticos podem fazer com que as águas residuais e os esgotos sobrecarreguem as estações de tratamento, permitindo que águas não tratadas e ricas em microrganismos resistentes a antimicrobianos contaminem comunidades vizinhas.
O relatório, que apresenta os destaques de um estudo mais detalhado a ser divulgado no final deste ano, pede que as autoridades formuladoras de políticas não baixem a guarda, mesmo quando a pandemia da COVID-19 recuar: “A pandemia de COVID-19 é um chamado de despertar para melhor compreender e aprimorar todas as áreas de preparação e prevenção de doenças infecciosas, incluindo suas dimensões ambientais”.
in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 09/04/2022
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