INTERNATIONAL VISION OF THE WATER RESOURCES OF THE GUARANI AQUIFER AND THE DANGERS OF THE EXECESSIVE EXPLORATION
Pedro Luis da Silva Pinto, advogado, escritor, especialista em direito internacional e doutor em ciências Jurídicas e Sociais.
Resumo: Se as águas superficiais são um problema tanto na legislação brasileira como na visão internacional, as águas subterrâneas são questão ainda mais recente. É nítida a ausência de regulamentação adequada às águas confinadas, e especialmente às águas transfronteiriças. No entanto, o assunto é cada vez mais freqüente por se tratar de tema da mais alta importância, tanto no âmbito legal, quanto no ambiental, quanto no econômico. A água não é uma propriedade estática, ela afeta e é afetada pelas regiões pelas quais passa, e essas regiões devem zelar pela sua utilização de forma a que não se prejudiquem mutuamente nem gerem graves conflitos – já que é praticamente impossível falar em “águas nacionais”, pois quase sempre atravessam as fronteiras geopolíticas.
Palavras chave: águas superficiais e subterrâneas, conflitos pela água, escassez, utilização.
Abstract: If the superficial waters are a problem in the Brazilian legislation and also in the international vision, the underground waters are a matter even more recent. It's clear the absence of the proper regulamentation to the confined waters, and especially to the crossing borders waters. However, the matter is increasingly more frequent by including a topic of such importance in the legal sphere as in the environmental and economic sphere. The water is not a static property, it affects and it's affected by the regions where it goes, and these regions must treat carefully its use, not harming each other, nor creating serious conflicts - since it's practically impossible to speak about ''national waters'', because it's almost always crossing the geopolitical borders.
Key words: superficial and underground waters, conflicts by water, Deficit, use.
Sumario 1. INTRODUÇÃO - 1.1. Visão legal das águas no Brasil - 1.2. O conflito das águas em diversos países e o excesso de exploração - 1.3. As águas subterrâneas e sua finitude 2. CONCLUSÃO - 3. BIBLIOGRAFIA
1. INTRODUÇÃO
Águas subterrâneas são uma questão nova em nossa constituição e na maioria dos ordenamentos jurídicos. Embora a carta magna brasileira contemple as águas subterrâneas, colocando-as sob o domínio federal, ressalva os interesses dos estados, e o que efetivamente ocorre é uma codominialidade que permite, em diversos momentos uma exploração excessiva. Na relação com outros países, a situação do Brasil não é diferente da grande maioria: a exploração dos recursos hídricos é feita com base nos próprios interesses, e não com o foco nos interesses de um grupo de países que também se servem naquele mesmo recurso. Isto é nítido em diversas situações de conflito que serão vistas adiante, e que pontuam em regiões, como África, oriente médio, Europa. A ausência de tratados relativos às águas subterrâneas é recorrente, o que dá ensejo ao uso abusivo em prejuízo de outras áreas hidrogeológicas, causando desequilíbrios, sem falar na carência, ou total ausência de tratamento de resíduos, que contribuem em muito para a contaminação de nossos lençóis freáticos.
1.1 Visão legal das águas no Brasil
As àguas subterrâneas recentemente passaram a ser uma problemática mais presente no cenário nacional e internacional, em função da previsível futura escassez deste líquido, do qual depende a sobrevivência humana.
Em nível nacional, as atenções se fixam na questão do domínio sobre as bacias hidrográficas e hidrogeológicas, pela situação de disposição de competências determinada pela constituição. Há uma crescente preocupação relativa à dominialidade e gestão dos recursos hídricos subterrâneos, isso porque a carta magna determina regimes diferentes para águas superficiais e águas subterrâneas, e não raro, encontram-se lacunas e conflitos nos dispositivos legais. Para a constituição, os estados podem estabelecer limites e fronteiras físicas para seu domínio, permitindo, por lacunas, que isso seja estendido às águas subterrâneas, o que pode dar
ensejo a acidentes ambientais com prejuízos e incalculáveis. O fato é que a constituição não contempla a transestadulaidade e a transnacionalidade de recursos hídricos não superficiais.
A superexplotação de poços pode rebaixar o lençol freático de maneira imprevisível, o que pode vir a prejudicar nascentes e rios, pois é ele que os alimenta; uma barragem em um rio pode bloquear uma área de descarga de um aquífero - a alteração de uma área de fratura pode diminuir a recarga de um aqüífero confinado. Enfim, embora pareçam pequenas as alterações, ao longo do tempo se tornam significativas, podendo afetar inúmeras regiões ao mesmo tempo.
O sistema brasileiro de gerenciamento de águas lembra o sistema francês, onde há uma preponderância federal sobre o domínio das águas, com algumas sensíveis diferenças: a França não possui um governo de federação, ou seja, é um estado único. Não têm conformação como o Brasil, pela união de várias unidades federativas; isso acarreta que, no Brasil, e por disposição da constituição, exista dupla jurisdição sobre as águas, federal e estadual ao mesmo tempo.
O intrincado sistema brasileiro de dominialidade permite a competência privativa da união para legislar sobre águas subterrâneas e superficiais, permitindo aos estados gerir de forma subsidiária as águas superficiais, quase que totalmente, como se estas não dependessem das águas subterrâneas.
Isto gera, por exemplo, trechos de rios que pertencem a determinados estados, e em outros são de domínio federal. Este mosaico de dispositivos legais se torna ainda mais grave quando se referem a águas transfronteiriças, já que uma mesma bacia hidrográfica pode estar sob domínio estadual e federal, com interferência múltipla.
Basicamente a legislação tenta articular os interesses dos estados, integrando-os através das competências ditadas pela união, sempre zelando pela independência entre eles. O Modelo de gestão termina pulverizado, o que dificulta tremendamente o controle das bacias hidrográficas, níveis de poluição, de uso, etc...
É preciso levar em conta também que a quantidade de bacias hidrográficas do Brasil é muito superior à média internacional, e as regiões hidrográficas são doze ao todo. Juntando-se a isso, há o fato de que aqüíferos em geral possuem estruturas compartimentadas, que não
necessariamente coincidem com as estruturas de superfície, como rios, nascentes e lagos. A sistemática constitucional tem que ser inteiramente revisada, para atender adequadamente a questão das águas subterrâneas, incluindo a previsão do uso de águas transfronteiriças, como quase sempre é o caso de aqüíferos.
1.2 O conflito das águas em diversos países e o excesso de exploração
Em relação aos demais países existem previsões de que, no futuro, a água deverá ser motivo de conflitos tão graves quanto os ocorridos em relação ao petróleo, em pelo menos em cinco áreas: as bacias dos rios Ganges, Jordão, Tigre e Eufrates, na área do Nilo, e na região do mar de Aral, na antiga união soviética.
A situação do Nilo é decorrente de sua formação, que se dá em território da Etiópia, país extremamente pobre, que vem ultimamente investido em barragens, enquanto que no Egito, onde o Nilo formará seu vasto delta e irá desembocar, investe em programas de irrigação, pois o delta do Nilo é fortemente agrícola. Como não existe acordo ou tratado diplomático sobre as águas do Nilo entre Etiópia e Egito, e o Egito já é responsável pelo consumo de dois terços do fluxo do rio, tendendo a aumentar, o atrito já existe. E isto sem levar em consideração o impacto ambiental no delta do Nilo a partir do desvio das águas.
Na Rússia, na área do mar de Aral, nutrido por dois grandes rios, hoje praticamente secos, há um cenário semidesértico, e praticamente todo o leito deste mar interno secou, tendo todo o processo se iniciado nos anos 60, com o desvio das águas para as plantações de algodão. Ao mesmo tempo, ficou seriamente prejudicada, senão inexistente, a atividade pesqueira da região, gerando uma bolha de pobreza numa área que antes era extremamente dependente deste mar. Uma das cidades, de nome Muynak, possui um porto que hoje fica a mais de 50 km do mar, e entre o porto fantasma e o mar, há um grande número de navios pesqueiros abandonados, numa estranha visão que só a escassez de água pode provocar.
Hoje, o desaparecimento do mar de Aral é considerado o provável e maior desastre ecológico do século 20.
Foto: cidade de Maynak. Disponível em http://www.artificialowl.net/2009/04/disasters-of-aral-sea-part-1-shipwrecks.html
Outro grande rio, o Colorado, ‘famoso’ rio do Grand Canyon, é disputado entre EUA e México para irrigação agrícola, sobre esse tema forma feitos nada menos do que oito acordos a respeito de suas águas. Desde a década de 20 a 30 em diante o rio Colorado vem secando, e hoje é praticamente inexistente, insuficiente para manter as populações que dele dependem.
No Ganges, Tigre e Eufrates, a preocupação, além da seca, é a poluição, que vem assoreando os rios. Não há nenhuma política pública nesse países, que margeiam esses mananciais com a intenção de tratamento dos resíduos sólidos e líquidos que busquem pelo amenizar o fluxo de detritos que são carreados diariamente para o leito desses rios.
E apenas foram mencionadas as águas superficiais, mas os mesmos fenômenos ocorrem com as águas subterrâneas, como o aqüífero que fica sob o rio Colorado, de nome Ogallala, e que banha oito estados americanos. Esse aqüífero vem sendo rapidamente explorado, e suas águas estão baixando muito mais rápido do que a natureza é capaz de repor. Entre 1978 e 2008, as áreas cultiváveis diminuíram de 5,2 milhões de hectares para 4,2 milhões de hectares, tendendo a diminuir para menos de 3 milhões de hectares. Enquanto isto, a demanda por terras cultiváveis somente cresce. Não é diferente no resto do mundo. Esse fenômeno se dá pela escassez de água para os projetos de irrigação.
1.3 As águas subterrâneas e sua finitude
Três quartos do planeta são recobertos por água, mas apenas 2,5% são de água doce, e deles, apenas 0,3% são imediatamente acessíveis ao consumo. Diferente do que se imaginava há poucas décadas, recurso hídrico não equivale a abundância de água: é necessário que haja água suficiente para manter o ciclo hidrológico, que nada mais é do que a evaporação, formação de nuvens, e precipitação, o que alimenta os rios e também nos aqüíferos em suas áreas de recarga. Parte da água que se precipita cai no oceano, ou em áreas extremamente distantes e inalcançáveis, e portanto, é preciso manter esse ciclo hidrológico de forma equilibrada.
Se não existe ainda risco de perda desses recursos hídricos, em função da quantidade de água existente no planeta, existe o efetivo risco de má distribuição, grande áreas de escassez, e conflitos iminentes em função da disputa por água.
Isso já é sentido em alguns países africanos e do oriente médio, e países insulares onde existe pouca água potável. Em compensação, países como Canadá, Rússia, Guianas, e
especialmente o Brasil, possuem uma abundância de água superior a todas as demais regiões hidrogeográficas mundiais.
O Uso dessa água varia de acordo com o clima, as áreas cultiváveis, a densidade demográfica, o nível de desenvolvimento, entre outros tantos fatores. É preciso considerar também nos níveis de poluição, pois a abundância de água não significa potabilidade.
Todas essas questões se aplicam ao Aquífero Guarani. E o que é possível perceber é que a legislação brasileira não é muito diferente do restante da legislação mundial: cada Estado aproveita a água em conformidade com sua conveniência, e na relação entre países ocorre o mesmo, e cada Nação faz o uso de seus recursos hídricos de acordo com sua necessidade.
Ocorre que a água, como já foi dito, não respeita limites geopolíticos, nem se distribui de forma igual para cada país. Mas não é incomum que as ações realizadas em um estado possam se refletir em outro em pouco tempo. Um claro exemplo disso é o da Etiópia, represando as águas do Nilo, gerando efeitos deletérios no Egito.
Fácil concluir que as águas, na verdade, são um problema internacional. Existe pouco consenso a respeito das águas superficiais, com teorias de co-império, onde as águas seriam propriedade dos estados que elas banham, teorias de servidões, preconizando que uns estados podem se opor aos outros, que uso dos recursos hídricos representam exercício e não abuso de direito. São teorias que formam a base para lidar com recursos hídricos transnacionais, mas não há pacificação nem aceitação completa sobre essas carentes teorias.
A questão dos aqüíferos é ainda mais complexa: as águas subterrâneas são ocultas, muitas vezes oferecem dificuldades ao seu completo estudo, relacionam-se com questões de soberania, porque envolvem o solo, e desta forma, relações e poder.
Os tratados hoje existentes a respeito de águas subterrâneas não parecem suficientes a preservar esses recursos, e acima de tudo, não fornecem garantias a todos os estados que são atingidos por esses lençóis invisíveis. Mas é claro que o abuso da utilização vem rebaixando alguns importantes aqüíferos em todo o mundo, de uma forma que a natureza não é capaz de repor.
É preciso que esses tratados preservem não só a adequada utilização da água, mas também a liberação de áreas de recarga. E que sela proibida a utilização excessiva e a poluição, que respeitem as necessidades econômicas e sociais dos países por onde passam esses aqüíferos, pois a água é pressuposto e condição para a sobrevivência e também para o desenvolvimento.
Como se verifica não se trata apenas de consumir de forma equilibrada, de preservar da poluição, mas do adequado gerenciamento, que somente poderá ser exercido pelos países de forma conjunta. As experiências internacionais são poucas. O Aquífero Guarani, tido como um dos maiores do mundo, não é infinito, necessita de cuidados que extrapolam questões nacionais e que devem ser discutidas e sobre elas buscadas soluções tecnológicas e ambientais que satisfaçam todas as nações permeadas por ele.
2. CONCLUSÃO
O que se pode concluir desta breve exposição é que o panorama brasileiro reflete o panorama mundial: o uso abusivo, em determinadas regiões, da água disponível, causa conflitos de interesses, problemas de desenvolvimento econômico, que decorrem diretamente da escassez de água, riscos ecológicos e ambientais, gerados exclusivamente pela ausência de regulamentação.
Os acordos e tratados internacionais sobre como fazer um uso adequado destes recursos não existem, há um hiato, uma omissão dos gestores públicos sobre o tema. O que salta aos olhos é que a água é uma questão internacional, cujo uso deve ser decidido em grupo ou em blocos, para que o uso inadequado em determinados pontos não causem prejuízo para outros locais.
A exploração de água é problema extremamente perigoso, é preciso um esforço conjunto para que não se torne uma problemática tão violenta quanto a do petróleo. Em se tratando do Brasil, é preciso que haja um aprofundamento, uma melhor análise e participação legislativa, colocando as águas subterrâneas e sua exploração sob controle federal, como sendo uma questão de prioridade estratégica nacional.
Embora o Brasil esteja numa posição invejável em termos de recursos hídricos, tanto as águas superficiais como as águas subterrâneas merecem uma maior atenção e preocupação do Poder Central. Como todos sabemos, o Aquífero Guarani é uma reserva subterrânea transnacional, não se sabe ao certo o montante que cabe a cada nação. Será que a aferição se fará pelo percentual de território onde encontra-se confinado ou será partilhado de forma equânime.
Todavia, os Países, Províncias e Municípios continuam dando permissão para sua exploração. Atualmente não há escassez, não há sede em nosso território sul-americano. Mas amanhã, será que o panorama será o mesmo. Será que o Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai terão o mesmo comportamento em relação ao uso das águas subterrâneas.
O contingente de detritos e dejetos que são descartados na natureza, especialmente nas áreas onde se localiza o Aquífero Guarani não deverão pesar na repartição das frações pluviais de exploração de cada País.
Por fim, acreditamos, por conclusão, que os quatro países devem formar um agência técnica com o fim de monitorar as áreas de reposição, os poços explorados e exploráveis do Aquífero Guarani, com a finalidade de garantir o uso sustentável de suas riquezas e principalmente, para evitar futuros conflitos pelo uso da água, como já já observamos em diversos locais do globo terrestre.
3. BIBLIOGRAFIA
AQUÍFERO GUARANI SOFRE EFEITOS DA EXPLORAÇÃO EXCESSIVA. Aquífero dura só mais 50 anos, dizem especialistas. In ABAS - Associação Brasileira de Águas Subterrâneas (Noticias) disponvel em http://www.abas.org/noticias_d.php?id_news=175 DISASTER(S) OF THE ARAL SEA PART 1: Shipwrecks around Muynak . disponivel em http://www.artificialowl.net/2009/04/disasters-of-aral-sea-part-1-shipwrecks.html
MEIRELLES, E.A. 2005. Aqüífero Guarani: uma proposta de regulamentação jurídica internacional. Tese (Doutorado) – orientação do prof. Guido Fernando Silva Soares, Departamento de Direito Internacional, Universidade de São Paulo
VILLAR, Pilar Carolina. A gestão internacional dos recursos hídricos subterrâneaos transfronteiriços e o Aqüífero Guarani. In Revista de Gestão de Água da América Latina – Disponível em: http://www.abrh.org.br/novo/revistas_rega.php
VILLAR, Pilar Carolina. Panorama da gestão das águas subterrâneas na ordem internacional e o caso do aquífero guarani. Disponível em http://www.agb.org.br/evento/download.php?i
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