Chefe do clima da ONU deixa posto em julho
Diplomata costa-ricense Christiana Figueres, secretária-executiva da Convenção do Clima e figura central para o sucesso do Acordo de Paris, anuncia que não pedirá extensão de seu mandato
Por Claudio Angelo, do OC –
A costa-ricense de 59 anos entregou na sexta-feira (19) umacarta aos países-membros da convenção dizendo que não aceitará uma renovação de seu mandato. Ela exerce a função desde 2010, quando se tornou a primeira mulher no cargo. É considerada uma principais responsáveis pelo sucesso da COP21, a conferência do clima de Paris, em dezembro passado, que produziu o primeiro acordo climático universal da história.
Filha do ex-presidente da Costa Rica José “Pepe” Figueres Ferrer, que governou por três mandatos, e irmã do também ex-presidente (tornado ativista ambiental) José María Figueres, Christiana atuou como negociadora de seu país junto à convenção antes de ser escolhida para substituir o holandês Yvo de Boer. Este renunciara ao cargo após o fracasso da COP15, a conferência do clima de Copenhague, em 2009.
Figueres assumiu com a dupla responsabilidade de juntar os cacos do processo, minado após Copenhague, e mostrar-se uma figura pública à altura de De Boer, simpático e altamente popular com a imprensa – e que protagonizou cenas históricas como o choro na plenária final da conferência de Bali, em 2007.
Conseguiu as duas coisas.
Em 2010, na COP16, em Cancún, trabalhou com o governo mexicano para romper a desconfiança reinante entre países desenvolvidos e em desenvolvimento. Ajudou-a o fato de ser um pouco de cada coisa: latina, filha de mãe americana e falante de um inglês perfeito, Christiana soube transitar bem entre os dois grupos. Seu pedigree político também ajudou-a a conquistar o respeito dos representantes de governo.
No caminho para o acordo de Paris, Figueres também desempenhou como ninguém o papel que se espera do secretário-executivo da Convenção do Clima: o de animador de auditório. Ao mesmo tempo em que navegava os difíceis bastidores da negociação, posava com celebridades e era vista sorrindo e aplaudindo em todos os anúncios de compromissos climáticos voluntários de empresas e governos locais. Fez até anúncio de sorvete. Era presença frequente nas festas organizadas pelas ONGs durante as conferências do clima – e dançava madrugada adentro.
A tática da UNFCCC nesse período foi de bancar o papel de otimista mesmo quando os impasses de sempre ameaçavam a negociação, e deixar os países-sede, em especial o Peru (COP20) e a França (COP21), como protagonistas políticos exclusivos, mas trabalhando muito perto deles (Figueres costumava referir-se a Laurence Tubiana, embaixadora francesa do clima, como “minha irmã gêmea”). Por detrás das cortinas, negociou textos colchete a colchete e foi uma das principais responsáveis pela inclusão do compromisso de longo prazo no Acordo de Paris – há quem diga que a menção a “descarbonização”, que inexistia na penúltima versão do texto, foi escrita por ela de próprio punho e inserida de última hora no rascunho do acordo.
Na imprensa, a chefe da UNFCCC martelou as mensagens de que “a descarbonização da economia é um caminho sem volta” e “Paris é um começo”: deixou claro que o rei estava nu, ou seja, que os compromissos somados dos países (as INDCs) eram insuficientes para alcançar a meta de limitar o aquecimento a menos de 2oC, mas que isso não era um problema, porque o que importa era o aumento progressivo da ambição. A estratégia colou, e o que poderia ser classificado como um fracasso prévio – um acordo que, por definição, não resolveria o problema que se propôs a resolver – acabou sendo considerado o maior triunfo do multilateralismo nos últimos tempos.
O diplomata brasileiro Everton Lucero diz achar normal a troca das pessoas que lideraram o processo até Paris. “A COP-21 foi um marco, fechou um ciclo, com a adoção do Acordo de Paris. Em 2016, inicia-se nova fase na UNFCCC, com mandatos mais específicos e técnicos para a regulamentação do acordo”, pondera. “É um bom momento para a renovação de quadros.” O próprio Lucero deixou o time de clima do Itamaraty e foi para o governo do Distrito Federal, chefiar a assessoria internacional.
Apesar do marco, a batalha diplomática do clima não está ganha. A missão do substituto de Figueres inclui um penoso processo de implementação do Acordo de Paris, que garanta que os compromissos não fiquem apenas no papel. E virá acrescida de uma responsabilidade burocrática: de agora em diante, o secretário-executivo da UNFCCC terá também o status de subsecretário-geral das Nações Unidas.
O embaixador brasileiro em Washington, Luiz Figueiredo, é forte candidato. (Observatório do Clima/ #Envolverde)
* Publicado originalmente no site Observatório do Clima.
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