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segunda-feira, 31 de agosto de 2020
Parques no Acre e Rio de Janeiro podem ser extintos pelo Congresso
por Aldem Bourscheit –
Especialistas elencaram as reservas ambientais mais ameaçadas por projetos de lei no país
Artigo de pesquisadores de universidades do Brasil e dos Estados Unidos listou as reservas ambientais mais ameaçadas por projetos de lei no Congresso Nacional. Elas podem ser extintas, reduzidas ou perder capacidade de proteger ambientes naturais. Relação inclui parques nacionais e outras unidades de conservação em vários biomas do país.
O trabalho publicado em revista da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) revela que a proteção da natureza pode perder mais de 2 milhões de hectares no país caso sejam aprovados projetos de lei tramitando no Congresso Nacional. A área é semelhante a 14 vezes a cidade de São Paulo.
A Estação Ecológica de Tamoios (RJ) e o Parque Nacional da Serra do Divisor (AC) podem ser extintos e convertidos em outros tipos de áreas protegidas. Ao mesmo tempo, parques nacionais do Jamanxim (PA) e das serras da Bodoquena (MS) e da Canastra (MG), Reserva Biológica do Cachimbo (PA) e Floresta Nacional de Brasília (DF) perderão grande parte de seus territórios.
O levantamento é assinado por Ricardo Machado, Mercedes Bustamante e Ludmilla Aguiar, da Universidade de Brasília (DF), e por Manuela Carneiro da Cunha, professora na Universidade de Chicago (Estados Unidos). Eles integram a Coalizão Ciência e Sociedade, grupo com 72 cientistas de instituições brasileiras.
Lista e distribuição das unidades de conservação hoje mais ameaçadas. Fonte: Coalizão Ciência e Sociedade
Somente no Pará, um dos líderes em desmatamento da Amazônia, nos últimos anos houve tentativas para encolher em 1,1 milhão de hectares unidades de conservação já delimitadas. Conforme os pesquisadores, iniciativas como essas têm como pano de fundo uma visão equivocada de que proteger a natureza impede o desenvolvimento econômico.
As propostas de recortes também atendem a interesses eleitoreiros ou econômicos de curto prazo, mais valiosos a muitos parlamentares do que cumprir a Constituição Federal e proteger ambientes naturais e populações que neles vivem. Jabutis e outras manobras legislativas são usados na tentativa de minar a proteção da natureza brasileira.
Em 2018, deputados e senadores tentaram reduzir os parques nacionais de Brasília e de São Joaquim e a floresta nacional de Brasília enxertando artigos numa medida provisória que transferia imóveis da extinta Rede Ferroviária Federal à União. O drible foi barrado pela mobilização social, mas as unidades de conservação seguem na mira do agronegócio atrasado e da especulação imobiliária.
ALERTA VERMELHO
Deputado Vermelho (esquerda) e Jair Bolsonaro (centro) em 2019. Foto: Adelino de Souza / Divulgação/GDia
Outras iniciativas não reduzem parques e outras reservas, mas sim sua capacidade de proteger os ambientes naturais e, ao mesmo tempo, ameaçam o conjunto de unidades de conservação do país. Reserva Extrativista de Canavieiras (BA) e Parque Nacional da Serra do Divisor (AC) podem ser transformados em Áreas de Proteção Ambiental para facilitar assentamentos e construção de rodovias.
Enquanto isso, projetos de lei na Câmara e no Senado tentam abrir uma estrada através do Parque Nacional do Iguaçu, um dos mais visitados do país e abrigo da última grande porção de Mata Atlântica no oeste paranaense. Mesmo com a possibilidade barrada na Justiça Federal, deputados como Vermelho (PSD-PR) engrossam o lobby junto a Jair Bolsonaro para forçar a obra na área protegida.
Como mostrei em reportagem d’O Eco, o projeto pode favorecer negócios do parlamentar. Além disso, permitirá a abertura indiscriminada de rodovias em outros parques país afora. Os prejuízos vão de desmatamento a atropelamentos de animais que devem ser protegidos. Só no Parque do Iguaçu, a via pode levar à perda 900 hectares de mata preservada.
Também preocupam os movimentos da família Bolsonaro para transformar áreas protegidas como a Estação Ecológica de Tamoios (RJ) numa “Cancún brasileira”. Ao contrário do mega balneário mexicano, a reserva brasileira protege mais de 200 espécies de peixes, inclusive ameaçadas de sumir do mapa, como garoupa, boto-cinza e mero.
Jair Bolsonaro foi multado em 2012 por pescar ilegalmente em Tamoios. Em dezembro de 2018 a multa foi anulada e, no ano seguinte, o fiscal que a aplicou foi exonerado. Desde então, sua família age abertamente para desconstituir a estação ecológica. Projeto de lei do senador Flávio Bolsonaro (sem partido) quer converter a região numa “Área Especial de Interesse Turístico”, acabando com a área protegida.
PROTEÇÃO DE MENOS
Mas o nó fica ainda mais apertado porque, apesar do tamanho que tem e dos ataques que sofre, o conjunto de reservas socioambientais ainda não protege como deveria a biodiversidade brasileira. Cerca da metade dos animais e plantas nativos do país não estão abrigados nas unidades de conservação já criadas.
Os pesquisadores que assinam o artigo na SBPC lembram que extinguir ou encolher áreas protegidas traz uma “momentânea sensação” de desenvolvimento econômico, mas a conta inevitavelmente chegará. Afinal, parques e outras reservas garantem qualidade de vida e recursos naturais para todos os brasileiros.
“São também importantes instrumentos que ajudam a economia do país. Rifá-los agora, da forma como alguns – e apenas alguns – propõem, é abrir mão de um enorme patrimônio público que dificilmente será recuperado e sobre o qual se apoiam nossas opções de desenvolvimento com sustentabilidade”, ressaltam.
Família Bolsonaro quer transformar a Estação Ecológica de Tamoios (RJ) numa Cancún brasileira. Foto: Divulgação
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