Por Aruna Dutt, da IPS –
Nações Unidas, 15/7/2016 – “Não deixar ninguém para trás” passou a ser o lema dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), mas resta muito a ser feito para chegar a concretizá-lo, afirmaram esta semana organizações da sociedade civil presentes a uma conferência de revisão dos avanços da Agenda de Desenvolvimento Pós-2015.
Ao contrário dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio da Organização das Nações Unidas (ONU), que não conseguiram atender a desigualdade estrutural, a sustentabilidade ecológica e as responsabilidades do Norte Global, a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável reconhece a “enorme disparidade de oportunidades, de riqueza e de poder” como imensos desafios para se conseguir o desenvolvimento sustentável, uma novidade em matéria de documentos intergovernamentais.
No primeiro ano dos 14 da Agenda 2030, ainda falta ver as mudanças no caminho para o desenvolvimento global, segundo o informe Spotlighton Sustainable Development 2016 (Foco no Desenvolvimento Sustentável 2016), publicado esta semana pelo Grupo de Reflexão da Sociedade Civil. “Não se deixa as comunidades para trás por esquecimento”, observou Warda Rina, da Women’s Major Group, uma das organizações que participaram da revisão dos avanços da Agenda 2030, “são políticas neoliberais que as excluem de forma sistemática”, destacou.
O estado dos ODS em muitos países pode ser descrito como de prosperidade crescente das classes altas, mas piora a segurança pública, a qualidade de vida e a pobreza multidimensional, diz o informe. “Com relação à Agenda 2030, há progressos e retrocessos”, escreveu Hector Bejar, representando a coalizão Social Watch, no Peru, que no informe diz que o “produto interno bruto cresce, mas com ele também cresce a desigualdade”.
Barbara Adams, também da Social Watch, disse que na implantação dos ODS, por ora, parece que alguns Estados membros aceitaram com reticência a agenda, e nas negociações houve muitas rejeições e muitos retrocessos. “As conversações sobre financiamento parecem voltar à sua dinâmica habitual. Se continuar o que está sobre a mesa, aparecerão obstáculos diretos para a concretização dos ODS”, alertou.
Um dos grandes obstáculos que a Agenda 2030 não atende é a nova geração de acordos bilaterais de investimentos e de livre comércio, que reduzem a capacidade dos governos de promover os direitos humanos e a sustentabilidade, e incentivam os países a competirem em uma corrida para o abismo, oferecendo taxas mais baixas e mão de obra mais barata para atrair capitais.
Por exemplo, o acordo de Associação Transpacífico, assinado em fevereiro, aguarda por ratificação, e a Associação Transatlântica para o Comércio e o Investimento, entre União Europeia e Estados Unidos, terminará no final deste ano. “Os acordos consideram padrões sociais, ambientais e de direitos humanos como possíveis barreiras não alfandegárias para o investimento e o comércio, que é preciso ‘harmonizar ou eliminar’”, diz o informe.
Sandra Vermuyten, da organização Public Services International, disse que muitos grupos da ONU são dirigidos por interesses corporativos e não são inclusivos. Por exemplo, o coordenador da Global Business Alliance para a Agenda 2030 é a Câmara Internacional de Comércio, à qual se atribui um papel crucial na implantação da agenda, mas defende as mesmas políticas desestabilizadoras do passado, que exacerbam as desigualdades tanto no Norte quanto no Sul, diz o informe.
Chee YokeLing, da Rede do Terceiro Mundo, indicou que os ODS não serão concretizados somente por meio de associações público-privadas ou de enfoques com múltiplos atores. “As legislações dos países, desde os Estados Unidos até os europeus, dão mais direitos às corporações do que aos seres humanos”, afirmou. “Demoramos 44 anos para reconhecer que a pobreza ainda está aqui, e que a desigualdade é um problema enorme. Mas agora o poder corporativo está muito mais concentrado do que antes”, acrescentou.
Outro exemplo das contradições da Agenda para 2030 é como se inclui a crise hídrica, em lugar de atender as causas de raiz, pontuou Meera K. Arunananthan, do Conselho de Canadenses. “A crise hídrica global não é resultado do rápido crescimento populacional, mas sim de um modelo econômico laborioso e sedento”, destacou. Isso inclui a privatização dos serviços básicos de água e saneamento, que o Banco Mundial promove nos ODS com programas de ajuste estrutural, acrescentou.
Outro estudo, divulgado no dia 11 pelo Overseas DevelopmentInstitute (ODI), no primeiro dia do Fórum Político de Alto Nível, concluiu que o custo de não deixar ninguém para trás em matéria de saúde, educação e proteção social nos 75 países dos quais tinham dados, é, em média, de US$ 739 bilhões por ano.
“Os 30 países de baixa renda necessitarão de US$ 70 bilhões adicionais ao ano para cobrir esse custo. No caso dos 45 de renda média, os governos têm fundos públicos suficientes para cobrir esses custos, mas o desafio é sua destinação”, diz o informe. No caso dos ODM, alguns países só começaram sua implantação dez anos depois de aprovados em 2000.
A demora em tomar medidas contra o aquecimento global agravou o desafio. Se não forem realizadas ações nos primeiros mil dias dos ODS, isto é, nos três primeiros anos, até setembro de 2018, os governos correm o risco de deixar pessoas para trás e de não cumprir alguns dos objetivos, alerta o documento.
Se a África subsaariana quiser eliminar a pobreza extrema, terá que tirar dessa situação,a cada ano,10% das pessoas nela se encontram, se começar a agir agora. Se demorar até 2018, terá que ser 13%, destaca o informe da ODI. “O mundo simplesmente não pode suportar mais atrasos que coloquem em risco a possibilidade de concretizar os ODS”, acrescenta o documento. Envolverde/IPS
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