por Busani Bafana, da IPS –
Bulawayo, Zimbábue, 31/5/2016 – Terminar com a falta de fundos da África para acelerar seu desenvolvimento econômico e social requer um novo enfoque para o uso de seu capital natural, afirmaram na semana passada especialistas reunidos na capital do Quênia para a segunda Assembleia da ONU sobre Meio Ambiente (Unea 2). É hora deste continente investir milhares de milhões de dólares, parte dos US$ 50 bilhões perdidos pelo fluxo ilegal de fundos, para agregar valor aos seus recursos naturais e minerais.
“O capital natural da África pode significar uma contribuição ambiental, social e econômica ao desenvolvimento sustentável e alcançar os ODS se for aproveitado de forma sustentável”, afirmou Richard Munang, especialista em mudança climática e políticas de desenvolvimento do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma).
Munang se referia aos ambiciosos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), aprovados no ano passado na sede da Organização das Nações Unidas (ONU) em Nova York. Aproveitar o capital natural da África de forma sustentável implica, entre outras ações, uma sólida gestão ambiental dos recursos, redução da perda de alimentos, fim da fuga financeira ilegal e dos crimes contra a vida silvestre, explicou Munang à IPS, antes da Unea 2, o fórum de decisão de maior peso em matéria ambiental.
Realizada a cada dois anos, a Unea reuniu, entre os dias 23 e 27 deste mês, cerca de 1.700 participantes de 155 países na sede do Pnuma, em Nairóbi, a fim de adotar medidas concretas em escala internacional para fazer frente aos principais desafios ambientais. Nessa reunião também se discutiu sobre áreas estratégicas para a implantação do Acordo de Paris sobre mudança climática e para a gestão do capital natural que, segundo Munang, será um fórum de política global para a África pelo qual se mobilizará apoio e se fixará uma agenda que a ajude a concretizar suas prioridades.
A declaração da Conferência Ministerial da África sobre Meio Ambiente (Amcen) pede, em relação ao capital natural deste continente, a criação de associações e adoção de medidas em escalas nacional, regional e global para reverter a atual perda de recursos naturais. Os dados revelam que a degradação dos ecossistemas custa à África cerca de US$ 68 bilhões ao ano e que a perda de alimentos colhidos retira US$ 4 bilhões anuais do setor agrícola.
A maior perda econômica foi em Fluxos Financeiros Ilícitos (FFI), que representa perda anual de US$ 50 bilhões. Para a África, custa US$ 20 bilhões por ano combater os crimes contra a vida silvestre, a exploração madeireira, a pesca e a mineração.
“Redirecionar os fundos recuperados para a economia significará uma injeção de até US$ 150 bilhões ao ano para reinvestir em áreas de elevado custo inicial, cruciais para o desenvolvimento sustentável, como saúde e educação, que necessitam, respectivamente, de investimentos de US$ 32 bilhões e US$ 26 bilhões anuais para atingir os ODS de números 3 e 4, ou como a infraestrutura, onde são necessários US$ 83 bilhões por ano para atingir o ODS 9”, pontuou Munang.
Os chefes de Estado e de governo africanos adotaram, em maio de 2012, junto a sócios dos setores público e privado, a Declaração de Gaborone para a Sustentabilidade na África, na qual se comprometem a promover o desenvolvimento sustentável. A declaração, avalizada pela Amcen como veículo para um desenvolvimento verde.
Antes desta última Unea, o ministro de Meio Ambiente, Vida Silvestre e Turismo de Botswana, Tshekedi Khama, afirmou que as vastas reservas naturais da África poderiam impulsionar a transformação social e econômica do continente. “Mas só a exploração dos recursos não bastará para gerar uma mudança duradoura”, ressaltou.
“Com as tendências atuais de consumo e crescimento populacional, a humanidade necessitará de dois planetas Terra para se abastecer em 2030”, apontou Khama, cujo governo, junto com os de Zimbábue e República Democrática do Congo, apresentou um plano claro sobre a melhor forma de administrar o capital natural para impulsionar o desenvolvimento sustentável e erradicar a pobreza.
Segundo Khama, “é crucial o mundo se unir para aprovar a resolução, a fim de expandir e diversificar nossas economias, criar emprego, conseguir a segurança alimentar, melhorar a produtividade de nossos ecossistemas e criar uma sociedade mais inclusiva”. Os incentivos econômicos para que a África administre melhor seus recursos naturais são convincentes: só esse continente poderia economizar até US$ 103 bilhões ao ano, com os quais seria possível financiar programas de desenvolvimento, acrescentou.
Munang destacou que uma associação de sucesso entre os atores do desenvolvimento, articulados na plataforma Adaptação baseada no ecossistema para a Assembleia da Segurança Alimentar, criada pela Comissão da União Africana, ajudará o continente a superar a falta de tecnologia, fundos, capacidades e políticas ótimas, que são barreiras para mobilizar o investimento no desenvolvimento sustentável.
A África precisa lidar com a segurança alimentar e nutricional, além da pobreza energética, tudo o que se pode resolver mediante um investimento adequado e sustentado, que possa destravar as rendas derivadas do capital natural. O Grupo Intergovernamental de Especialistas sobre Mudança Climática (IPCC) citou a energia renovável como uma das chaves para fazer frente à mudança climática.
A África tem uma grande oportunidade de impulsionar uma mudança limpa progressiva dos combustíveis fósseis para as energias renováveis, pois conta com grande radiação solar e vento, que não emitem gases-estufa, nem contaminam a atmosfera. Mais de 620 milhões de pessoas na África não têm eletricidade, o que o ex-secretário-geral da ONU e presidente do Painel para o Progresso da África, Kofi Annan, qualificou de injustiça, porque rouba a dignidade de milhões de pessoas.
Segundo o informe do Progresso da África – Energia, Pessoas, Planeta: Aproveitar a Energia da África e As Oportunidades Climáticas –, a África subsaariana sofre uma elevada pobreza energética, com mais de 60% de sua população sem serviço elétrico e 80% sem fogões limpos. Além de sua importância para enfrentar a mudança climática, há outra razão fundamental para desenvolver os recursos renováveis na África: a demanda por energia que aumenta rapidamente.
Ao mencionar que o apoio econômico aos países africanos elevou o controle sobre a gestão de seus recursos naturais, o presidente do Grupo de Países Menos Adiantados, Tosi Mpanu-Mpanu, pontuou à IPS que esses fundos não devem ferir a autonomia local. E explicou que “a chave para garantir que os países africanos se beneficiem de seus recurso naturais, e protejam sua prosperidade e o crescimento no longo prazo, é encontrar a ligação correta entre o crescimento dos recursos naturais e o desenvolvimento sustentável”.
“Imagine dois cenários, um ‘verde’, com elevado grau de energia renovável e muito pouca contaminação pelos combustíveis fósseis, e outro ‘cinza’, com elevada exploração de recursos naturais, que impulsione um forte crescimento econômico de curto prazo”, explicou Mpanu-Mpanu. “O cenário verde pode implicar um elevado custo inicial, com grandes benefícios no longo prazo, enquanto o cinza será mais barato no começo, mas acabará arruinando o clima, nossos ambientes e nossas economias”. Envolverde/IPS
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