A maioria das pessoas acredita que as soluções para os problemas brasileiros e da humanidade passam longe de suas atitudes cotidianas. Aquecimento global e as mudanças climáticas; a poluição do ar e os congestionamentos dos centros urbanos; a contaminação dos rios e a sujeira das ruas; a multiplicação de lixões a céu aberto; o desperdício – todos são problemas que nos afetam. Podemos, porém, agir para que isto mude!
Como deputado federal estive diretamente envolvido na aprovação da Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), coordeno o Grupo de Trabalho de Eficiência Energética, na Comissão de Minas e Energia, e integro a Frente Parlamentar Ambientalista. Mas de nada vale aprovarmos políticas públicas sem a efetiva participação da sociedade e de cada um de nós!
Em 2011, a organização não governamental WWF solicitou ao Ibope uma pesquisa nacional para compreender melhor os hábitos de consumo e descarte e o nível de consciência dos brasileiros em relação ao assunto. A avaliação mostrou que preço, durabilidade e marca foram os atributos mais destacados pelas pessoas. Questões de sustentabilidade, como a de embalagens recicláveis ou de trabalho infantil e escravo na fabricação pouco são levadas em conta pela maioria pesquisada.
O consumo sustentável implica na escolha de produtos que foram fabricados com economia de recursos naturais, promoveram empregos decentes e que ao fim de sua vida útil puderam ser reaproveitados ou reciclados.
Na prática, a teoria é outra, moldada na estrutura capitalista de produção global onde o consumo, como receita líquida e certa, define quem somos e o poder de compra e os bens adquiridos caracterizam nossos “defeitos” e “qualidades”. O que importa mais às pessoas é que possam comprar cada vez mais e que os produtos adquiridos não lhes deixem numa posição “desvantajosa”, no mínimo em relação ao grupo a que pertencem. A roda que move a economia é a mesma que entre seus raios expõe a pobreza e promove a violência dos desprovidos contra a ostentação dos que tudo consomem.
Mudança de comportamento leva tempo, exige ação incisiva e democrática dos governos e exercício da cidadania. O termo “sociedade de consumo” foi cunhado para denominar a sociedade global baseada no valor do “ter”. Mas felizes observamos a afluência dos valores de sustentabilidade integrando a consciência coletiva. Essa nova postura pode promover as mudanças, o abandono do desperdício e adoção de outro comportamento.
A contradição de um povo que terá a seu dispor bens e serviços variados, como automóveis, tvs, celulares, moda, mas ainda não conta com a universalização do saneamento básico, da saúde e do transporte público de qualidade. A ausência de políticas de transportes para os cidadãos aliada ao incentivo do deformado sonho da posse de um automóvel promove na capital paulista um dos maiores desastres urbanos e ambientais do país.
O carro particular, consumido com sofreguidão, é a maneira mais cara de se deslocar em São Paulo. Em abril passado, segundo o Detran-SP, os automóveis somavam mais de 70% da frota de cerca de 7,4 milhões de veículos da capital. Utilizar automóvel na cidade só vale a pena se o mesmo custar menos que R$30 mil e se o proprietário rodar mais que 17 km diariamente, tanto com gasolina, como com álcool, conforme cálculos do professor Samy Dana, da Fundação Getúlio Vargas. Do contrário, é mais vantajoso financeiramente o paulistano utilizar táxis para se locomover.
É claro que falamos aqui de proprietários de veículos, não da massa de cidadãos que enfrenta o transporte público para trabalhar. Não há teoria de consumo responsável – ou falta de transporte público – que justifique o ancestral incentivo dos governos ao transporte individual. Cada automóvel paulistano transporta em média 1,4 pessoas. Um ônibus padrão carrega 35 passageiros. Um ônibus com mais ou menos 15 metros é dez vezes mais eficiente do que 25 automóveis, que ocupam cerca de 150 metros de uma faixa de tráfego.
ca11 “O consumo nosso de cada dia...”
Os custos dessa situação podem ser classificados em dois tipos: o tempo ocioso das pessoas no trânsito e os gastos pecuniários impostos à sociedade. O primeiro tipo é custo de oportunidade. Considerando apenas os períodos críticos dos congestionamentos pela manhã e tarde/ noite e o custo da hora de trabalho em São Paulo, esse valor teórico em 2008 era de R$ 26,8 bilhões. Em 2004, somava R$ 15,4 bilhões.
Já o custo pecuniário deriva de uma comparação entre o trânsito fluindo e congestionado. Consideram-se os gastos referentes ao consumo de gasolina pelos carros e do diesel pelos ônibus, o impacto dos poluentes na saúde da população e o aumento no custo do transporte de carga. O resultado é um custo total superior a R$ 6,5 bilhões por ano. Em 2004, era de R$ 5,3 bilhões.
A cultura da mobilidade individual é hoje a principal responsável pela poluição do ar e pelo aquecimento global, além de ser fonte de poluição sonora e de desperdício de tempo em congestionamentos. Priorizar alternativas como o transporte público, a bicicleta ou a caminhada possibilita a melhoria da circulação de pessoas na cidade e aumenta a qualidade de vida de todos, segundo o Instituto Akatu, que defende o consumo sustentável.
Nossa população cresceu moderadamente. E isso é bom porque ela é bem adequada à apropriação do território, dispõe de fartos recursos naturais, fala a mesma língua e pode ocupar as fronteiras em paz se o Estado assumir suas responsabilidades republicanas. Em 2020, 117 milhões de brasileiros farão parte de um novo arranjo social que alguns insistem em chamar de ampla classe média, usando os padrões e valores da desgastada sociedade de consumo, mas que eu identifico como uma população de poucas crianças, jovens adultos e muitos idosos confrontadas com novos paradigmas, mas sem as mudanças culturais que os governos deveriam estar hoje estimulando, os preparando para o futuro.
Os brasileiros têm direito, a poder discernir e escolher entre bons automóveis, boas escolas, bons empregos e cidadania em oposição à falta de planejamento e administração competentes que gera política imediatista da mão para a boca, sem compromisso algum com a sustentabilidade econômica e ambiental do país.
* Arnaldo Jardim é deputado federal pelo PPS-SP e presidente da Frente Parlamentar em Defesa da Infraestrutura Nacional.