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terça-feira, 22 de setembro de 2009

Selo de Qualidade de ‘Produção Fora-da-Lei’ - ANA ECHEVENGUÁ



A cidade de Criciúma-SC é famosa pela degradação ambiental praticada pela indústria carbonífera. Em 1980, a região foi reconhecida como a 14ª Área Crítica Nacional, para efeitos de controle da poluição gerada pelas atividades de extração, beneficiamento e usos do carvão mineral (Decreto n. 85.206).

E um dos grandes aliados dessa poluição é a indústria ceramista. Quando ela obtém licença para extrair a camada de argila do solo (porque muitas atuam sem qualquer licenciamento), ela adquire o direito de cavar o buraco, extrair a argila e fechar o buraco. Ou seja, explorar e recuperar a área que explorou. Mas não faz isso: após a exploração, abandona a área escavada (muitas vezes o buraco atinge até mesmo a camada de carvão mineral)... Gastar com recuperação do que destruiu? Pra quê? se ela sabe que não há fiscalização e, em decorrência, qualquer punição para os crimes ambientais que comete.

A argila é a matéria-prima da cerâmica. Os resíduos dessa produção, em especial, o lodo de cerâmica, são altamente insalubres porque contêm metais pesados, principalmente chumbo. Jogados de qualquer jeito na natureza, podem contaminar os organismos vivos. Se isso ocorre, depositam-se no tecido ósseo e gorduroso, gerando doenças*. Por isso, o lodo de cerâmica deve ser tratado e destinado para aterros com estrutura protetiva que evite a contaminação do solo, ar e água.

Mas, na hora do descarte dos seus resíduos, a indústria ceramista, para evitar custos:

- joga o lodo a céu aberto;

- fala sobre o reuso desse. Uma ‘fórmula verde’ – não fiscalizada - de reaproveitamento dos resíduos;

- doa o resíduo para fazer ‘tijolos ecológicos’ ou cimento. Doa geralmente para pobres, claro!

Tudo isso leva à falaciosa ‘produção com resíduo zero’.

No lixotur que faço na região, vejo com freqüência lodo de cerâmica jogado no solo. Afinal, como dito antes, não há fiscalização nem punição. Pesquisei e encontrei coisas estranhas:

1. Uma dessas indústrias depositava em um aterro sanitário da região cerca de 3 mil toneladas por mês de lodo. Repentinamente, rescindiu o contrato, e não enviou mais resíduo pro aterro. O que houve? Parou a produção? Parou de adquirir matéria-prima? Parou de vender?

2. A cerâmica vizinha dessa primeira, de olho na economia da concorrente, já está alardeando que possui uma fórmula de redução de resíduos. Será que estão varrendo o lodo pra baixo do tapete?

3. Soube até que na região tem uma cerâmica que é de um deputado estadual... por isso, nem vou tecer comentários: ela goza de ‘imunidade parlamentar’.

4. Quanto aos projetos sustentáveis, mesmo que sejam bons, carecem de aprovação. Quem deu autorização a eles? Quem está recebendo este lixo? Indústria cimenteira, olarias, fábricas de tijolos...? Quem o transporta?

Parece que a impunidade é um forte atrativo para a vinda de várias empresas para Santa Catarina. A Cerâmica Elizabeth, da Paraíba, instalou-se em Criciúma em uma área já degradada, na região mais pobre da cidade (Quarta Linha).

Começou bem!

Pouco sei dessa empresa; mas apresenta o rançoso discurso-padrão vinculado:

- ao apelo social: gerou 150 postos de trabalho; a partir de fevereiro de 2010 poderá gerar mais 80 empregos. Desta forma, mesmo que polua e degrade muito, não terá suas portas fechadas porque isso provocaria um problema social na cidade;

- à mágica postura ambientalmente correta. Aquela história da ‘produção com resíduo zero’.

Li nos jornais que a empresa paraibana escolheu Santa Catarina porque o produto cerâmico aqui fabricado possui um selo de qualidade.

Será que ela estava se referindo ao ‘Selo de Qualidade de Produção Fora-da-Lei’??

* - http://ambientes.ambientebrasil.com.br/residuos/artigos/metais_pesados.html
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FONTE : Ana Echevenguá, advogada ambientalista, coordenadora do programa Eco&Ação, presidente do Instituto Eco&Ação e da Academia Livre das Água, e-mail: ana@ecoeacao.com.br, website: www.ecoeacao.com.br.

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