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terça-feira, 15 de setembro de 2009

Brasil já perdeu uma Venezuela em Cerrado


Área desmatada apenas em Goiás equivale a território do Paraná, indica monitoramento inédito por satélite, financiado pelo PNUD.

O Cerrado, segundo maior bioma brasileiro, mantém pouco mais da metade (51,2%) de sua extensão original. Os outros 995.220 km² — área superior à da Venezuela — foram transformados em pasto, soja, algodão, cana e carvão vegetal, especialmente a partir dos anos 1970, inclusive com incentivos governamentais e internacionais. Diferentemente da Amazônia, a degradação do Cerrado era pouco conhecida até a última semana, quando o Ministério do Meio Ambiente divulgou dados sobre o desmatamento naquele bioma, de 2002 a 2008.

O levantamento faz parte de um projeto de monitoramento dos biomas brasileiros via satélite, uma parceria entre o PNUD, o Ministério do Meio Ambiente e o IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis). No primeiro ano — até 31 de dezembro de 2009 —, será financiado integralmente pelo PNUD, que também será responsável pelos editais para contratação de pessoal e compra de equipamentos. No total, serão disponibilizados US$ 663.997, mas governo e PNUD estudam ampliar esse valor até 2010.

Os primeiros resultados, refetentes ao Cerrado, mostram que Maranhão, Mato Grosso e Minas Gerais são os Estados que mais desmataram o bioma desde 2002. Ainda assim, o Maranhão ainda guarda boa parte da área original de Cerrado (77%). Já em Estados muito afetados pelo desmatamento antes de 2002 (como São Paulo, Mato Grosso do Sul, Paraná, Distrito Federal e Goiás) restou pouco. São Paulo, o que mais desmatou proporcionalmente, já havia acabado com 81,6% de seu Cerrado antes de 2002, chegando a 2008 com 83,2% do bioma degradado. Mato Grosso do Sul, segundo da lista, havia desmatado 75,4% de sua parcela do bioma até 2008.

O total de Cerrado já retirado de São Paulo, 67,5 mil km², equivale à três vezes a área de Sergipe. Já no Mato Grosso do Sul foram 162,8 mil km², área pouco menor que a do Uruguai. Em números absolutos, o Estado que mais desmatou Cerrado na história foi Goiás, que acabou com 212,6 mil km², mais do que um Paraná. Desmatamento pouco menor, 204,6 mil km², foi registrado por Minas Gerais.

"São Paulo, Minas Gerais, Goiás e Mato Grosso do Sul foram a primeira fronteira agrícola, principalmente nos anos 1970”, observa o diretor de conservação da biodiversidade do Ministério do Meio Ambiente, Bráulio Dias. Ele conta que, com avanços das pesquisas nas décadas de 60 e 70, foi possível corrigir o solo do Cerrado, antes impróprio para agricultura. Seguiram-se então grandes programas de ocupação do bioma. Com o tempo, houve um deslocamento da fronteira para oeste da Bahia, sul do Piauí, Maranhão, Tocantins e Mato Grosso. “É a nova fronteira agrícola, incentivada pela saturação da região, o aumento da demanda e a busca por terras mais baratas”, explica. Apesar de a fronteira ter se deslocado, de acordo com Dias, as culturas continuam praticamente as mesmas: soja, algodão, cana-de-açúcar, carvão vegetal e pecuária.

Todos perdem

Nos últimos seis anos, enquanto a taxa de desmatamento na Amazônia caiu 50%, o desmate do Cerrado continuou no mesmo ritmo, com uma média de 21 mil km² ao ano. A área degradada neste bioma passou de 41,9% do original em 2002 para 48,2% em 2008. Os 127,6 mil km² derrubados no período equivalem a quase três vezes o estado do Rio de Janeiro.

Degradar o Cerrado traz consequências negativas para os próprios agricultores. “Não é do interesse deles aumentar o desmatamento”, afirma o diretor do ministério. O aumento, afirma, põe em risco a água. Quando as chuvas diminuem, a vegetação nativa reduz a perda de água, o que não acontece com as culturas agrícolas. “Todas as culturas atuais perdem pelo menos o dobro de água que a vegetação nativa. Isso altera o balanço hídrico, o lençol freático tende a reduzir e corremos risco de perda da perenidade dos rios”, afirma Dias.

As consequências disso extrapolam os limites do bioma. “O Cerrado é a grande caixa-d’água do Brasil”, afirma. Além das nascentes de boa parte das bacias hidrográficas do país estarem ali, o bioma é constituído por planaltos, o que o torna essencial na produção de energia nas hidrelétricas. “A hidrelétrica precisa de água e precisa de queda d’água, e 50% de todo o potencial de geração de energia está no Cerrado”, diz.

Além do risco de prejudicar as bacias hidrográficas e as hidrelétricas, o diretor tem outro argumento para desencorajar o desmatamento por parte dois agricultores. “O Cerrado emite hoje tanto CO2 quanto a Amazônia. Daqui para frente vamos ter dificuldades para exportar os produtos cultivados ali por uma exigência dos compradores que não querem produtos causadores de emissões. Podemos ter uma proibição da compra da soja brasileira, por exemplo.”

Providências

O objetivo, após a compilação dos dados do desmatamento no Cerrado, é dar início a um plano de combate à prática. O Ministério do Meio Ambiente pretende criar mais áreas protegidas por unidades de conservação no bioma, aumentar a fiscalização na região e incentivar a redução do desmate pelos próprios produtores.

O monitoramento do bioma também deve continuar. A ideia, segundo Bráulio Dias, é desenvolver um sistema que possa identificar o desmatamento num período mais curto do que o atual, que permite ver a degradação apenas de ano em ano. “Com este sistema, só temos dados quando tudo já foi desmatado”, argumenta Dias. A ideia é desenvolver um sistema semelhante ao DETER (Detecção do Desmatamento em Tempo Real), que detecta o desmatamento na Amazônia de mês em mês. Apesar de menos precisas do que os dados anuais, as informações deste sistema permitiriam um combate mais efetivo à degradação do bioma.
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FONTE : Joseph E. Stiglitz* (Envolverde/PNUD Brasil)

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