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quinta-feira, 8 de outubro de 2009

O aquecimento global e a reinvenção do mundo


A construção de uma economia de baixo carbono está exigindo da humanidade não apenas criatividade e inovação nos processos econômicos, mas também agilidade na decisão do setor público.

Os diagnósticos das principais causas do aquecimento global e suas conseqüências para povos de todo o planeta já são bastante conhecidos por cientistas, especialistas e gestores públicos e privados. Segundo Simon Zadek, diretor da consultoria AccountAbility e membro do conselho internacional do Instituto Ethos, as tecnologias existentes e os recursos financeiros disponíveis são suficientes para a construção de uma economia global de baixas emissões de carbono. Isso custará entre 65 bilhões e 100 bilhões de euros por ano entre 2013 e 2015. “Será preciso realizar a maior transformação no mundo desde a revolução industrial”, diz Zadek.

No entanto, o desafio não é apenas a transformação da economia ou implantação de tecnologias limpas. Zadek, que esteve em São Paulo participando do Diálogos Itaú/Unibanco de Sustentabilidade, aponta diferenças importantes nos tempos de decisão dos governos e em suas prioridades. Um exemplo é que os Estados Unidos ficaram mais de 10 anos sem reconhecer os acordos do Protocolo de Quioto e, agora, estão estabelecendo metas muito aquém das acordadas internacionalmente. “A China já tem 50 milhões de veículos elétricos, enquanto EUA e Europa ainda estão 'pensando no assunto'”, diz o especialista.

Zadek, falando a uma platéia de executivos em São Paulo, e dividindo o palco com Ricardo Young, presidente do Instituto Ethos, Marcus Frank, diretor do Departamento Brasileiro de Mudanças Climáticas da McKinsey e Marcelo Batistti, gerente de riscos socioambientais do Itaú/Unibanco, vê uma disparidade muito grande nos ritmos de investimento que estão sendo feitos na Europa e Estados Unidos e países como Brasil, China e Índia. Ele mostra que esses países já estão muito avançados em desenvolver uma economia de baixo carbono, e cita o programa brasileiro de etanol como um avanço nesta direção. Além disso, conta que a China gera 40% de toda a energia fotovoltaica do mundo e fabrica 80% das turbinas eólicas do planeta. “É a economia limpa que cresce mais rápido no planeta”, diz.

As oportunidades da transformação das economias nacionais e globais em modelos baseados em baixo carbono são espetaculares, podem gerar trilhões de dólares em riquezas, empregos e fluxo de capitais. Mas para isto será preciso integrar políticas públicas com estratégia de negócios. Para o Brasil em especial as oportunidades são imensas. Para Marcus Frank, da McKinsey, o primeiro olhar dos gestores brasileiros deve ser dirigido aos setores florestal e de agronegócios, responsáveis por mais de uma gigatonelada de emissões de carbono por ano. “Resolvido isso o Brasil pode continuar se desenvolvendo com calma e sem grandes preocupações em setores que são os vilões no resto do mundo, como energia e transportes”. Além disso, a produção brasileira de biomassa precisa se diversificar e se sofisticar em direção a novas soluções. Um exemplo é a necessidade da Europa em trocar o combustível de suas termoelétricas, normalmente fóssil, para fontes renováveis. “O Brasil pode oferecer peletes de madeira com alto potencial energético para estas usinas com grande vantagem competitiva”, explica o executivo. Para ele a disponibilidade de biomassa é um fator positivo invejável para o Brasil.

O processo de decisão para a criação de um novo modelo civilizatório, com características muito diferentes tanto sob o ponto de vista de gestão privada como de governança pública, é outro desafio relevante. É notável perceber que países com controle político centralizado, como a China, estão avançando mais rápido no planejamento das mudanças para a nova economia. No entanto, os países democráticos precisam entender o sentido de urgência das transformações. “Os múltiplos públicos e as várias instâncias decisórias contribuem para que não haja agilidade na tomada de decisões”, diz Ricardo Young, do Ethos. Ele acredita que é preciso trabalhar melhor a criação das políticas públicas necessárias para a transformação, de forma que sua institucionalização em um marco legal claro torne mais atraente os investimentos necessários. “O setor privado precisa de segurança institucional para agir”, explica.

O crescimento de uma economia de baixo carbono e baseada em biomassa tem o potencial de deslocar o eixo do desenvolvimento e trabalhar sobre as distorções históricas do Brasil. Produtos florestais e agrícolas de alto valor agregado vão criar polos de geração de riquezas fora dos estados tradicionais do Sul e Sudeste, acredita Young. “Os bolsões de miséria do Norte e Nordeste podem ser trabalhados a partir de uma ótica de valorização de seus potenciais produtivos”, diz.

Para que este cenário seja realmente a base para um futuro sustentável, o presidente do Ethos afirma com veemência que “não podemos falhar em Copenhague”, quando serão criados os marcos regulatórios para esta nova economia. “Temos o desafio de mudar nossa economia e transformar nossa democracia em um modelo de gestão mais eficiente, limpo, e capaz de enfrentar a urgência das mudanças climáticas”, pontua. Ele lembra que 2010 será um ano de eleição, no qual o presidente eleito tem potencial para permanecer por 8 anos no poder, ou seja, quase todo o período até 2020, quando o mundo já deverá ter avançado muito nas questões de redução de emissões globais de gases de efeito estufa.

Para o desenvolvimento dos novos negócios, baseados em alta taxa de inovação, um dos setores que será mais demandado é o financeiro. As modelagens tradicionais de avaliação de riscos não conseguem oferecer os volumes de capital necessários aos investimentos massivos necessários. Marcelo Batistti, do Itaú/Unibanco, vê o desafio como um dos grandes obstáculos a serem enfrentados rapidamente. “Tradicionalmente bancos fazem análise olhando para a história de um determinado negócio ou setor. Ou seja, avaliando o passado”, explica. Para as mudanças que a economia precisa, com alto grau de inovação, será necessário encontrar uma modelagem de analise de risco que avalie o futuro, o potencial e os benefícios dos novos negócios. “Não sabemos ainda como fazer, mas o mais importante é termos um marco legal baseado em políticas públicas internas e globais”, explica.

De uma forma geral o sistema bancário brasileiro está se comportando bem na construção de um modelo de gestão financeira que incorpore inovação e ciência, mas ainda não tem instrumentos que permitam a redução dos riscos para patamares de mercado. “Será preciso rever, por exemplo, todo o sistema de resseguros para que a diluição dos riscos seja mais adequada”, explica o executivo. No entanto, ele ressalta que não vê nisso um problema e sim um desafio técnico.

As mudanças necessárias para o Brasil e o mundo são muito grandes e urgentes. No entanto, este debate mostrou que são possíveis e que já existem tecnologias e capitais necessários. A grande questão está agora na construção eficaz das políticas públicas nacionais e globais, que devem ser integradas ao mundo dos negócios, onde a economia de fato gira e enfrenta desafios.
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FONTE : Dal Marcondes, especial para o Instituto Ethos (Envolverde/Instituto Ethos)

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