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quarta-feira, 17 de dezembro de 2008

MATA ATLÂNTICA E O PLANO NACIONAL DE MUDANÇAS DE CLIMA (16/12/2008)


Um copo parcialmente com água: meio cheio ou meio vazio? Obviamente, depende da expectativa de quem tem sede ou de quem tem papel relevante em garantir qualidade e quantidade desse recurso.

Similar pensamento poderia ser aplicado ao PNMC – Plano Nacional de Mudança de Clima, lançado pelo Presidente Lula em sessão solene no dia 1 de dezembro em Brasília, no mesmo dia que em Poznan, Polônia, tinha início a 14ª. Conferência das Partes da Convenção Quadro de Mudança de Clima (CoP-14) para negociar nossos arranjos e medidas para a Convenção da ONU e para o Protocolo de Quioto. Mesmo assim, precisaríamos de um elevado grau de generosidade para dizer que o copo está pela metade.

Sim finalmente temos um instrumento denominado de plano. Com anos de atraso (16 desde a Rio-92, quando o Brasil assinou a convenção ou pelo menos 14, desde quando o Congresso Nacional, em 1994, a ratificou e tornou-a equivalente a lei de cumprimento obrigatório), o Estado , em todos os níveis e setores de governo, conta com um esboço inicial de linhas de ações e políticas para lidar com desafios associados ao aquecimento global: a mitigação de emissões de gases de efeito estufa; a avaliação de vulnerabilidades a partir do estudo regionalizado de impactos das mudanças de clima, para permitir a implementação de medidas, de curto a longo prazos, de adaptação aos efeitos irreversíveis; as áreas nas quais a ampliação do conhecimento cientifico ou o desenvolvimento e difusão de tecnologias são fundamentais, e por fim, mas não por último, ações no campo de educação e comunicação. Está longe ainda de ser um plano

De um Plano espera-se um documento objetivo, que defina metas, ações para o seu cumprimento e indique instrumentos concretos, incluindo a origem dos recursos e financiamentos necessários para que sejam cumpridas. Importante também atribuir responsabilidades a todos os organismos governamentais e setores da sociedade envolvidos com a questão das mudanças climáticas e apontar os ônus decorrentes do seu não cumprimento. Fundamental é indicar os instrumentos e meios, e as instituições responsáveis pelos meios, que podem fazer as propostas saírem do papel e se concretizam em contribuições e efeitos positivos para a sustentabilidade do país.

REDD – Redução de emissões de gases de efeito estuda do desmatamento e degradação de florestas é um desafio, parte do problema e parte da solução para lidar com mudanças de clima. Não haverá regime multilateral ou política nacional séria, em qualquer país, que não considerar REDD. Para lidar com REDD há diferentes abordagens e instrumentos, tanto as centradas em políticas públicas, e seus instrumentos de controle, de fundos públicos, de taxas, etc. como as voltadas a sistemas voluntários ou de mercado.

O rascunho divulgado no dia 25 de setembro de 2008 foi uma mistura de carta de intenções e colcha de retalhos das ações que o país pretende e de algumas que já diz adotar, nessa área, lançando mão de programas que já estão em curso (e que independem do PNMC). A versão final mantem essa característica, embora tenha avançado em definir parâmetros mensuráveis para alguns objetivos. Dois deles, complementares entre si, são relevantes para os que lidam com a conservação e uso sustentável de florestas:

a) Buscar a redução sustentada das taxas de desmatamento, em sua média quadrienal, em todos os biomas brasileiros, até que se atinja o desmatamento ilegal zero;

b) Eliminar a perda líquida da área de cobertura florestal no Brasil, até 2015

No primeiro desses objetivos, o Governo atual definiu que o Brasil deve buscar a “redução do desmatamento em 40% no período 2006-2010, relativamente à média dos dez anos do período de referência do Fundo Amazônia (1996-2005), e 30% a mais em cada um dos dois quadriênios seguintes, relativamente aos quadriênios anteriores”. Entretanto, Segundo declarações do Ministro Minc, no primeiro quadriênio a atenção fica limitada à Amazônia, sendo que monitoramento e controle de outros biomas seriam iniciados somente depois de 2011, em função da necessidade de organizar sistemas de dados e informações. Mas a efetivação dessas metas, Segundo o Presidente da República, que assina e lançou o plano, tem uma condicionante: “existência de recursos nacionais e internacionais, novos e adicionais, para fiscalização e reorientação econômica da região florestada, incluindo os captados pelo Fundo Amazônia”. Será que o Presidente da República, que teve autoridade suficiente para decidir sobre liberação de créditos aos setores agrícola e automobilístico, não tem poder suficiente para garantir pelo menos os recursos nacionais necessárias? Enfim, reduzir desmatamento na Mata Atlântica e em outros biomas só se tiver dinheiro?

Para o segundo eixo florestal, o PNMC pretende, “além de conservar a floresta nos níveis estabelecidos no objetivo anterior, dobrar a área de florestas plantadas de 5,5 milhões de hectares (ha) para 11 milhões de ha em 2020, sendo 2 milhões de ha com espécies nativas, promovendo o plantio prioritariamente em áreas de pastos degradados, visando à recuperação econômica e ambiental destas”.

Na seção sobre impactos, vulnerabilidade e adaptação aos efeitos de mudanças de clima, o PNMC cita que “o Ministério de Ciência e Tecnologia - MCT - conduzirá, no âmbito do Programa Nacional de Pesquisa em Biodiversidade – PPBio, ações voltadas à avaliação dos impactos da mudança do clima na biodiversidade, o qual expandirá sua rede de parcelas permanentes de monitoramento para a Mata Atlântica em 2009, com o objetivo de monitorar grupos de organismos que respondam rapidamente à mudança do clima”. Conforme consta no documento, “nesse bioma serão conduzidos estudos dos efeitos da mudança do clima na biodiversidade com ênfase na análise da redução da distribuição geográfica de espécies; das mudanças no ciclo de vida; na dinâmica populacional; na estrutura e composição das comunidades, e nas estratégias de adaptação e sobrevivência das espécies”.

Sem desconhecer a contribuição de estudos desse tipo, certo é que poderíamos desde já articular muitas medidas de adaptação, notadamente no que concerne a criar e fortalecer resiliência de ecossistemas ou de identificar e proteger nascentes e áreas de mananciais, mediante um amplo programa de reflorestamento, mediante a restauração de áreas degradadas com ações de reflorestamento, por exemplo. No bioma Mata Atlântica, no qual vivem mais de 120 milhões de pessoas, a recuperação de ecossistemas e de cobertura florestal pode ser iniciada desde já para podermos garantir serviços ambientais importantes, como água, especialmente para as grandes e médias cidades. Transformar a paisagem de nossas cidades, mediante novos padrões urbanísticos e de edificações será necessário, não somente para promover uso eficiente de energia e adequado conforto térmico, mas para re-introduzir o “componente verde” via ações de arborização, de parques municipais, entre outros. Prover refúgios de vida silvestre áreas verdes, inclusive em áreas urbanas, será fundamental para diversas espécies da fauna do bioma Mata Atlântica. Se quisermos ter ruas com sombras, para que um pedestre possa caminhar com mais conforto em um dia ensolarado de um planeta mais aquecido em 2040, teremos que iniciar o plantio das árvores agora. Se quisermos prevenir “derretimentos” de morros, teremos que considerar os parâmetros de ocupação de encostas e várzeas previstos no Código Florestal e teremos que fazer toda a sociedade, especialmente os integrantes dos Executivo, Legislativo e Judiciário, sejam fieis zeladores e cumpridores da legislação da Mata Atlântica.

Mas nada disso está no PNMC. Não passam de uma dúzia, incluindo títulos de figuras, as referências explícitas à Mata Atlântica nas mais de 120 páginas do PNMC. Gotas insuficientes para iniciar o enchimento de um copo. Sim, temos um documento, um “gancho” em mudança de clima para engajar governantes, empresas e lideres da sociedade em ações de sustentabilidade ambiental. A tarefa é enorme, mas possível e necessária.
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FONTE : Rubens Born é coordenador do Vitae Civilis Instituto para o Desenvolvimento, Meio Ambiente e Paz (http://www.vitaecivilis.org.br) & Gaines.(Envolverde/Vitae Civilis)

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