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quinta-feira, 19 de maio de 2011

A retomada do desmatamento em Mato Grosso: um retrocesso inaceitável

O desmatamento voltou a disparar em Mato Grosso. A situação resulta do enfraquecimento da política ambiental e pode ficar pior caso medidas contundentes não sejam implementadas imediatamente.

Informações do Sistema de Alerta do Desmatamento (SAD) do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon) divulgadas ontem (17) confirmam a situação crítica que já sinalizamos em nota divulgada em 2 de maio (ver aqui): somente no mês de abril, o SAD detectou 243 quilômetros quadrados de desmatamento e 1.755 quilômetros quadrados de degradação em áreas florestais do estado. No acumulado do período (agosto de 2010 a abril de 2011), o desmatamento cresceu 96% e a degradação 466% com relação ao mesmo período do ano anterior.

Esses números são ruins, mas podem ficar ainda piores, pois grande parte da degradação recente pode pré-configurar desmatamento. Segundo o Imazon, a degradação florestal corresponde a situações onde florestas foram “intensamente exploradas pela atividade madeireira e/ou queimadas”. Como os meses da estação chuvosa não permitem queimadas e a exploração madeireira não poderia atingir áreas tão grandes em tão pouco tempo, é provável que grande parte da degradação registrada corresponda à preparação das áreas para o desmatamento de corte raso. Isso implica que os números de desmatamento poderão continuar em alta nos próximos meses.

Outro aspecto gravíssimo da situação atual, comprovado pelas nossas análises e por informações de campo das operações de fiscalização realizadas pelo Ibama, é ressurgimento dos megadesmatamentos (com área acima de 1.000 hectares, correspondente a 10 quilômetros quadrados), muitas vezes, realizados com o uso de “correntão”, uma técnica que possibilita destruir extensas áreas de floresta em poucos dias. Esse fenômeno havia desaparecido em Mato Grosso nos últimos anos e seu reaparecimento é extremamente preocupante.

Essa retomada do desmatamento no estado é uma calamidade ambiental, que também traz sérias consequências no plano político e socioeconômico. Municípios que poderiam sair da lista de municípios críticos do Ministério do Meio Ambiente e, assim, receber vários benefícios do governo federal, terão que permanecer nessa lista e sofrer sanções por mais alguns anos. As metas de redução do desmatamento do estado ficam comprometidas, e a meta de desmatamento ilegal zero até 2012 está sendo jogada por terra. Essas metas são a base do Plano Estadual de Prevenção e Controle do Desmatamento e Queimadas. E além dos limites do território de Mato Grosso, uma alta tão expressiva do desmatamento no estado compromete também a capacidade do Brasil cumprir com suas metas de redução das emissões de gases de efeito estufa, assumidas perante a comunidade internacional, o que pode gerar impactos negativos sobre a busca de um acordo global visando à mitigação das mudanças climáticas.

Essa calamidade era previsível e evitável. Previsível porque apesar da forte redução do desmatamento que vinha ocorrendo desde 2005, havia elementos claros mostrando que a situação ainda não estava sob controle – especialmente, os fatos de que a quase totalidade do desmatamento continuava sendo ilegal, que a regularização ambiental de propriedades rurais progredia lentamente e que a degradação florestal continuava com índices muito elevados. Previsível também porque a demanda por produtos agropecuários nos mercados nacional e internacional só tem perspectiva de aumentar, refletindo-se nos preços da soja e do gado, que ficaram desde o início deste ano cerca de 25% e 30% superiores, respectivamente, ao mesmo período do ano passado.

Evitável porque, nesse contexto, uma atuação muito firme do governo deveria prevenir qualquer possibilidade de retrocesso na contenção do desmatamento. Invés disso, temos visto um afrouxamento da política ambiental do estado e uma pressão pelo enfraquecimento dos instrumentos da gestão ambiental em nível federal. O desastre que vivenciamos em 2010 com recordes de queimadas não foi enfrentado de forma contundente pelo governo do estado; no final de 2010, o mesmo governo resolveu oferecer mais dois anos de prazo aos proprietários rurais para realizarem o Cadastro Ambiental Rural (CAR), quando deveria ter lançado uma campanha de notificações para aqueles que ainda não tinham aderido ao programa MT Legal; e, em abril deste ano, o governador sancionou a lei do zoneamento socioeconômico-ecológico, que denunciamos como zoneamento ruralista por expandir as áreas de consolidação agropecuária sem consideração pelas restrições ambientais, permitir a regularização de desmatamentos recentes (até a data da publicação da lei) e, ainda, eliminar a exigência de reserva legal em propriedades até 400 hectares.

Em nível federal, a pressão atual pela votação do novo Código Florestal também contribui para aumentar a pressão de desmatamento. O texto em tramitação prevê uma anistia geral do desmatamento ilegal, a isenção de reserva legal em propriedades menores que quatro módulos fiscais e a possibilidade de compensação e regularização de desmatamentos novos ou futuros realizados em áreas de reserva legal. Segundo informações de campo, esse seria um fator primordial por trás dessa corrida para desmatar grandes áreas.

Sendo assim, espera-se do governo medidas fortes e imediatas para poder reverter esse quadro. Essas medidas devem incluir:

- o posicionamento público inequívoco do governador do estado sobre a situação do desmatamento ilegal no estado e o anúncio de medidas drásticas permitindo conter a tendência atual de aumento, reafirmando a meta de desmatamento ilegal zero em 2012;

- uma intervenção imediata dos órgãos ambientais nas esferas federal e estadual, em escala compatível com a gravidade da situação;

- a não aprovação nas instâncias federais do zoneamento de Mato Grosso, de forma que possa ser revisado e adequado à realidade socioambiental do estado;

- uma profunda revisão do texto atualmente em tramitação para a alteração do código florestal, resolvendo os problemas apontados pela Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência – SBPC e pela Associação Brasileira de Ciência – ABC, bem como pelos analistas das organizações integrantes da Campanha SOS Florestas.

Instituto Centro de Vida – ICV
Cuiabá, 18/05/2011
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FONTE : IBAMA, colaboração do Instituto Centro de Vida para o EcoDebate, 19/05/2011.

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